sábado, 25 de junho de 2011

Talvez?



Como estrela cadente rasguei o espaço
Apenas um fugaz traço sobrou no fim,
Cinzas, tristeza e um simples traço
Foi tudo, apenas, quanto ficou de mim,

Ergui as mãos, fiz preces aos céus
Com fé rezei, pedi, chorei e implorei
Acreditava na existência de um Deus,
Estava enganado, perdi porque acreditei.

Agora ando perdido, só, neste deserto,
Numa dor que me consome sem se ver,
Já não sei que fazer, nada está perto

Procuro em vão para saber quem sou
Quem procuro? Não sei bem ao certo!
Talvez deseje esse Deus que me deixou.


E quatro anos vão passados...



Não é muito importante mas o meu Blog faz hoje 4 anos.



Deixo, a todos os que me visitarem, uma fatia de bolo






E uma taça de espumante.




Obrigado por todo o carinho.



quinta-feira, 23 de junho de 2011

O baile





Os homens voltavam do trabalho e os carros puxados pelas bestas cansadas, faziam uma enorme chiadeira nos solavancos das pedras da calçada.

O dia ia, lentamente, desaparecendo no horizonte. A noite adivinhava-se fria, pois o Sol não chegou para aquecer a terra.

Os rapazes e as raparigas da aldeia andavam num frenesim, pois hoje era o grande dia do baile da festa.

Na Sociedade Recreativa a azáfama era enorme.

O conjunto musical, composto por quatro rapazes, afinavam os instrumentos num desafinado conjunto de sons e sopros.

Não tardava os homens mais aperaltados, do que o habitual, iriam mirar as raparigas que a pouco e pouco ocupavam as cadeiras distribuídas ao redor do salão.

As mães, nas filas mais recuadas, estavam atentas não fosse algum rapaz mais atrevido abusar do tesouro que com tanto cuidado guardavam.

Olhei em redor e desde logo fiquei preso numa deusa que sobressaía entre as demais.

Estava na primeira fila. Toda vestida de branco, dum branco tão alvo que se confundia com a leitosa cor da tês. Naquele conjunto só o negro dos cabelos que em suaves caracóis lhe emolduravam a doçura do rosto angelical, punham alguma nota de cor.

Quando o conjunto, num som dissonante, começou pedi de imediato àquela visão para dançar. Enlaçou-se nos meus braços com uma leveza que mais parecia uma pena a deslizar ao sabor de uma brisa. Tinhas uns olhos negros, profundos, como dois lagos que me contemplavam com tanta doçura que as minhas mãos tremiam nas costas de tão suave criatura.

Não era da aldeia, segundo me disse, era da vila e viera de propósito ao baile.

Mas, perguntei eu:

-Quer dizer que depois vais embora e não te voltarei a ver?

-Nem pensar, estarei sempre na terra à tua espera. José Romão é o meu pai e todos o conhecem. Não tarda terei que abalar, à meia-noite alguém me vem buscar.

Encostou-me o rosto que estava gelado. A noite, de facto, prometia ser muito fria.

Tirei o meu cachecol vermelho e cobri-lhe os ombros.

-Amanhã já tenho um pretexto para a ir visitar, vou buscar o meu agasalho.

Sorriu de uma forma tão doce e desapareceu muito rápida no escuro da rua.

Foi uma noite de insónias. A moça não me saia da cabeça e nem sequer lhe tinha perguntado o nome. Mas decerto não seria difícil.

Mal acabei o pequeno-almoço tomei o rumo da vila, ansioso para contemplar aquele sorriso que me deixava tão transtornado.

Era uma jornada rápida, mas o tempo parecia não ter pressa de passar.

Cheguei à povoação. Um homem, à porta dum café, olhava-me curioso.

-Boa tarde, onde mora o senhor José Romão?

-Amigo, vem tarde o Zé Romão morreu, ou fez ou vai fazer um mês. Com ele já não pode

-Mas....eu... propriamente, gaguejei, não queria falar com ele, mas com a filha,
não me lembro do nome.

-Dá no mesmo. O Zé, a Celestinha e a mãe morreram no mesmo desastre. Foi além na curva que vai para a ponte do ribeiro. Como lhe disse deve ter sido há um mês. Foi uma desgraça muito grande.

-Não pode ser! Estive ontem a dançar com a Celeste!

-Alguém mangou consigo, amigo. Mas vá além ao cemitério e vai ver três campas novas ao fundo da vereda, tem lá as fotografias.

Agradeci, ganhei coragem e fui, e lá estavam as três campas.

Não precisei de ver mais nada.

O meu cachecol vermelho estava estendido em cima da pedra, junto a uma foto esmaltada da Celeste.

Não olhei para trás, entrei no carro e desapareci na curva da estrada.

Nunca mais danço com estranhas



quinta-feira, 16 de junho de 2011

Num arco de flores





Partistes, de repente, num arco de flores
Num terno adeus, num até mais não.
Fiquei tão só, carpindo minhas dores,
Na mais longa e dolorosa escuridão.

Nada mais interessa, nada mais existe,
Só o espinhoso escuro da minha solidão.
Morri... também... no dia em que partiste,
Tudo acabou, mais nada existe... desde então.

Escuto a tua voz...suave...no meu pensamento
Melodias de palavras murmuradas... só para mim
Murmúrios doces...sons de puro encantamento;

Arco de flores... sorriso que o tempo já murchou,
Morro devagar. Sentindo a dor do meu sofrimento.
Que chegue a hora, não quero mais ser quem sou.


terça-feira, 14 de junho de 2011

Lamento





Deixem-me pensar que ainda ando como andava nos tempos em que a ventura era minha companheira.

Em que corria com a alegria estampada no rosto e em que as rugas não faziam, ainda, parte do meu ser.

Em que a felicidade era tão comum que nunca pensei que houvesse infelicidade.

Deixem-me pensar que um dia me deito e que acordo num tempo que era o meu. Quando a luz, ainda, me acompanhava;

Acordar numa época em que não vivia nesta escuridão, nestas trevas em que de repente me deixaram.

Quero voltar a sentir no peito a alegria da realização.

Quero imaginar que nada aconteceu, que vivo o pesadelo de uma vida desgraçada, mas que um dia acordo e nada era verdade.

Que apenas a minha tão pródiga imaginação me tinha atraiçoado.

Deixem-me lançar o meu grito de revolta, mas não o escutem.

Deixem-me arrastar o que me subsiste, mas não deixem que me levem o tão pouco que me resta.




domingo, 5 de junho de 2011

Memórias de um passado



Estugou o passo. A pressa de chegar a casa e acabar de vez com essa situação deu-lhe forças. As pernas nem sempre correspondiam ao ritmo que tentava impor, mas a vontade era tanta que esquecia aquela dor que, há meses, não o deixava.
O calor começava a apertar e na testa começavam a aparecer gotículas de suor.
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No outro dia sentiu um peso no peito. Era uma sensação estranha. Parecia que estava oco, e uma dor aguda penetrava deixando uma sensação de desconforto. Respirou fundo tentando meter nos pulmões o ar que lhe parecia faltar. Tudo era estranho, a sua volta parecia que uma névoa se ia desprendendo. Sentia a cabeça a andar à volta.
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Era uma coisa esquisita, era como uma agonia. A dor não era muito forte mas o desconforto era enorme. O peito parecia que transportava toda a angústia do mundo.
Queria respirar mas o ar entrava com dificuldade. A cabeça zumbia como se de repente estivesse cercada de abelhas.
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Olhou em volta e desfilou as más recordações da infância que não teve. Via-se enfiado num calções coçados e presos por um suspensório de pano que lhe cruzada o abaulado peito, coberto com uma bonita camisa feita com o pano velho de outra. A sacola era de serapilheira parda e os livros que transportava eram as sobras de um menino que um dia os vendeu no alfarrabista. A pedra onde fazia as contas, e que bem as sabia fazer, era a angústia constante. Por tudo e por nada se partia e iria sentir no corpo e nas faces o desabar do mundo.
Não podia olhar os próprios olhos mas dizem que apesar de tudo deixavam transparecer ladinice, esperteza e uma vontade enorme de enfrentar a vida.
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Os anos passavam tão rápido que nem deu porque estava a crescer. A vida estava marcada em todos os poros do corpo franzino. O trabalho era monótono, sem emoções, sem realização. Era… enfim, então Sr. Dr., como estão os meninos? Meninos, dois abortos feios como o pai, convencidos como toda a família e inúteis como todos os que os rodeavam e enchiam de mimos e prazer.
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Manhã cedo com o frio a entrar pela escassa roupa, era esperar pelo eléctrico operário, sempre era mais barato. As senhoras, poucas, abafavam o frio nos belos e felpudos casacos e alguns homens aconchegavam o gordo pescoço no sobretudo de lã de camelo.
Um dia, talvez, ainda tivesse um. Mas seria difícil porque nos familiares não havia nenhum que um dia pudesse ser transformado.
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Houve um tempo em que pareceu que o tempo tinha parado. Foram umas férias feitas de emoções. Era como que o alvo de todas as atenções. Passaram tão rápido que ainda hoje sente na boca a doçura de tão bons momentos. Os dias eram longos e preenchidos de todas as brincadeiras. De repente era o herói de uma qualquer banda desenhada.
Corria pelos campos e sentia no rosto a brisa da liberdade. À noite entre as pernas do avô, aconchegava a cabeça nos carinhos desconhecidos.
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Um dia numa enorme fila quis ver como a morte leva os poderosos. A pouco e pouco avançava. Muito devagar, tão devagar que perecia que a própria fila não tinha principio.
Mas, depois de horas, lá conseguiu ver aquela fraca figura estendida num esquife. O ar mais sereno que um morto pode ter. As pessoas passavam devagar. Algumas inventavam umas lágrimas e como carpideiras faziam a sua boa acção para que todos pensassem que era um desgosto sentido. Ele passou sereno, deslumbrado com tudo o que via. Pensava, porque conseguem chorar, quando todos sabiam que era apenas o medo que os levava aquele espectáculo. Mas, o presidente estava ali estendido, e um novo já se perfilava para continuar tudo aquilo que aquele não tinha feito. Iria de certo cortar muitas fitas, inaugurar o que os outros fizessem e receber os aplausos pelos discursos gastos e sem nada de novo.
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Lá fora a vida continuava naquele ritmo a que já nos habituamos. Na jardim da Estrela as criadas passeavam nos trajes domingueiros sempre na mira de um militar garboso que afoitamente desse um piropo.
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A dor continuava mas não queria dizer nada. Pensando que de certo já ia passar. O relógio que lhe trabalhava nos ouvidos deixava um enorme desconforto.
O chilrear dos pássaros entrava pelas janelas e agudizavam os padecimentos. A cabeça não parava e de certo iria estoirar.
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Estendeu o corpo magro no sofá. Fechou os olhos e esperou que o sono lhe desse algum alivio, que o libertasse de todo o mau estar e angustia que há muito se apoderara dele.
Ficou tão leve que se sentiu a pairar, a dor passou e o mau estar foi como se nunca tivesse existido.
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Tão estranho ver a sala de cima, a mesa com os restos de uma refeição inacabada, as cadeiras dispostas de forma simétrica, a televisão onde o pó brilhava no escuro do ecrã, o sofá com um corpo enroscado numa posição desconfortável.
Parecia, mesmo, ser ele que ali estava estendido.
O mesmo rosto amarelento e encovado, as mãos engelhadas, juntas, como numa última prece.
Tudo tão irreal e tão confuso.
Ao longe a música e a luz intensa pareciam estar a chamar, a dor desaparecera, os ouvidos já não chiavam no cérebro. Nunca se sentira tão bem.

Foi entrando devagar, bem devagar………


sexta-feira, 3 de junho de 2011

Eu tenho um sonho...






Ele há tanta mulher! mas por que fantasia
Entre tantas, só uma a nossa simpatia
Distingue, escolhe e quer! Uma só avassala,
Nos dulcifica o olhar e nos perturba a fala!
(Marcelino Mesquita)





Estou preparado para o que vem a seguir, mas juro que gosto muito de todas...




Eu tenho um sonho. Eu sei que é quase irrealizável, senão impossível. Mas tenho esse sonho!
Eu gostava de perceber as mulheres. Sei que é difícil, mesmo irrealizável.
As crianças são transparentes. Os homens previsíveis.
As mulheres são enigmáticas, fechadas e difíceis de contentar.
Nunca estão satisfeitas, querem sempre mais. Gostam de receber muito e dar pouco.
São ciumentas, possessivas, inconformadas.
Gostam de mirar os homens, admiram muitos e sonham com alguns.
Acham normal. Se calhar até é!
Mas se um homem olha, de soslaio, um rabo mais audacioso é um drama.
Se um homem contempla uma revista de corpos bonitos é um porco, mas elas podem olhar. Para elas é tudo inocente. Para eles é maldade.
Uma mulher pode encontrar-se com um amigo e ir almoçar. É vulgar. É amizade!
Se o homem vai almoçar com uma amiga é estranho. Há interesse escondido, é pecaminoso.
Mas que fazer, são assim.
O mal é que não há outras e já não as devem inventar!