Aos meus amigos/as, do
Brasil, que fazem o favor de me visitar e têm a amabilidade em me deixar belas mensagens
de amizade peço desculpa por esta pantomina, sei que não vão compreender pois são
problemas cá do burgo e que vos passam, felizmente, ao lado,
Uma peça em três
actos, como convém, podia ser ficção mas se calhar não é.
Segunda-feira, 15
horas, dia cinzento
1º Acto
Uma sala e um balcão
com alguns livros em estantes. No lado de dentro uma menina com uma bata azul e
uma caneta na mão, no lado de fora um sujeito com uma pasta debaixo do braço.
Diz o
sujeito:
-Então bom dia! Venho tratar da minha licenciatura, quem me
pode atender?
Responde a
menina:
-Posso ser eu, quer fazer a sua inscrição? Espero que tenha
em ordem os seus documentos.
Volta a
dizer o sujeito:
-Mas que documentos, que historia é essa, eu tenho
experiência profissional e um currículo mais que suficiente para uma
licenciatura e até, quem sabe, até já com um mestrado.
Volta a
falar a menina:
-Bom, isso já não é comigo, tem que ser com o senhor reitor,
vou-lhe marcar uma entrevista. Deixe ver, espere lá, bom, bom, na sexta-feira
às 10 horas. Tá bom? Fica em nome de quem?
Fala o
sujeito:
-Doutor Óscar!
Admira-se a
menina:
-Mas se já é doutor porque quer a entrevista?
Subleva o
sujeito:
-Bom, parece que não percebeu eu sou doutor porque nasci
para ser doutor.
2º Acto
Sexta-feira, 10
horas, chove torrencialmente
Uma sala de entrada,
um banco corrido e um homem vestido como um porteiro
Fala o
sujeito:
-Venho para a entrevista com o senhor reitor
Responde o
homem vestido de porteiro:
-Entre, entre, ele está à sua espera.
Uma sala mascarada de
escritório, móveis escuros e pesados e sofás clássicos em cabedal castanho
Um reitor, figura insignificante,
enterrado numa cadeira de pele castanha vai apontando num caderninho os factos
e acontecimentos.
Diz o
reitor:
-Então o caro Óscar quer habilitar-se a uma licenciatura,
não é verdade?
Responde
o sujeito:
-Pois caro reitor, quero porque tenho direito a isso, pois
saiba o amigo que eu até já fui gaiteiro no rancho da minha terra e até numa
manifestação do 1º de Maio, lá na minha aldeia, fui eu que fiz o discurso.
Fala o
reitor;
-Muito me conta, isso é notável, nem todos se podem gabar de
tais acontecimentos, só por isso já tem direito a uma porrada de créditos.
Rejubila
o sujeito:
-Mas há mais, há muito mais, que eu sou uma pessoa de muitos
saberes e com uma experiencia do caraças, perdoe o termo, mas na minha terra
dizemos assim.
Palavras
do reitor:
-Não tenho dúvidas disso pois o nosso amigo comum, sabe bem quem
é, foi ele que mo remendou, disse-me da injustiça do seu professor, quando
acabou a instrução primaria, não lhe ter dado logo a licenciatura, mas não era
possível eram outros tempos e outras leis. Mas adiante, que mais podemos juntar
aqui na sua candidatura?
Continua
o sujeito:
-Então aqui vai, fui tesoureiro na Sociedade Recreativa o Pimpim,
fui cronometrista na corrida dos carrinhos de rodas de esferas durante a feira
de Agosto, ajudei o padre, lá da nossa paróquia, durante a missa.
Exulta o
reitor:
-Estou um pouco confuso na licenciatura que prefere, embora
a sua experiência dê para tanta coisa, é vasta! Mas afinal que licenciatura
pretende?
Deleita-se
o sujeito:
-Ainda não tinha pensado nisso, o que acha mais adequado à
minha experiência?
Volta o
sujeito:
-É difícil dizer mas, penso que, algo como Desenvolvimento
Organizacional, não acha bem? Só tem um pequeno problema tem que fazer
Metodologias das Ciências Sociais.
Assusta-se
o sujeito:
-E como se faz isso? Sou uma pessoa muito ocupada e o nosso
partido precisa de mim.
Descansa-o
o reitor:
-Não vou complicar, eu mando-lhe, por correio electrónico, o
enunciado e logo me manda a resposta.
Pergunta
o sujeito:
-Esta bem, posso responder no domingo?
Acalma-o
o reitor:
-Pode e na segunda-feira tem o seu certificado pronto e
depois é só pagar na secretaria.
Sussurra
o sujeito:
-Senhor reitor, é de homens como o senhor que o país precisa
para andar para a frente.
Baba-se o
reitor:
-Pois eu sou muito prático e gostei de o atender senhor
doutor.
3ª Acto
Manhã cinzenta,
ameaça chuva.
O mesmo balção, a
mesma menina e o mesmo sujeito
Declara o
sujeito:
-Venho pelo certificado!
Responde
a menina:
-Está pronto é só pagar a inscrição, o curso e o exame.
Pergunta
o sujeito:
-Qual a minha nota em Metodologias das Ciências Sociais?
Responde
a menina:
-Está no certificado, 18 valores. Quer reclamar?
Gargalha
o sujeito:
-Não, não, acho que está óptima.
Cai o pano
envergonhado.
17 comentários:
Apesar de já estar habituada aos finais inesperados... fiquei surpreendida!
Essa imaginação!
Vou tirar uns dias 'sem fazer nada'.
Beijo
Laura
Primeiro, Manuel, parabéns!
Além de bom cronista/contista, você é um extraordinário Teatrólogoo...
Quanto ao tema da peça (muito interessante), sinceramente, gostaria de entender onde se passa: Portugal ou Brasil?
Quando eu pleteei uma Licenciatura, já possuía o curso médio (liceu, em Portugal), fiz exame de seleção e cursei 4 anos de estudos em universidade,para obter o diploma.
Há casos, esporádicos, de "compras" de diplomas em universidades
particulares,no Brasil. Poderia ser um caso assim, que o tenha inspirado para este texto teatral...(?)
Um abraço,
da Lúcia
Meu querido Manuel
Não digo nada, porque infelizmente retrata uma realidade que infelizmente se passou no nosso País.
Gostei como sempre da maneira como contas os factos.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
Olá amigo Manuel, Hilariante comédia onde quem ficou envergonhado foi o pano. Que imaginação meu amigo. Adorei. Beijos com carinho
Mas onde é que eu já vi este teatro.
O país não precisa destes "chavalos"
Parece-me melhor não dizer mais porque eles teimam que foi assim e que tudo é mesmo verdade e descaradamente o assumem.
Ai...ai esse pano da vergonha ...seguiu no funeral de Sá Carneiro e daí para cá "népia"...
¸.¸❤✿•.¸
Você tem razão, não entendi mesmo sabendo que aqui é o paraíso da corrupção.
Bom fim de semana, amigo!
Beijinhos.
✿彡
¸.¸❤✿•.¸
Olá,Manuel!
Mas,meu amigo estou sempre a me surpreender por aqui!
Um texto em atos! Só li Shakeaspeare em atos!
Pelo que pude entender(não sei se captei a essência),é uma crítica política.Enquanto os professores passam anos estudando, se especializando para exercer uma profissão os políticos(ás vezes até sem diploma algum...infelizmente)escolhem o que mais os agradam(principalmente os cargos que rendem muito dinheiro...), sem esforço ou especializaçõa nenhuma!
*Por aqui não é diferente.Nosso antigo presidente não possuia nem o ensino médio completo...
Sem falar nos inúmeros vereadores eleitos sem o básico(semi analfabetos!).
Mas, se puderes diga-me,qual a essência do seu texto?O que se passa por ai?
Beijos e meu carinho sempre!
E na volta do tempo..., gosto muito de ler os seus textos e agradeço pelos elogios que sempre deixa registrado no Perseverança.
Mas é você que merece os méritos, são perfeitos, sonhadores e muito além de crônicas, grande abraço
NIcinha
E na volta do tempo..., gosto muito de ler os seus textos e agradeço pelos elogios que sempre deixa registrado no Perseverança.
Mas é você que merece os méritos, são perfeitos, sonhadores e muito além de crônicas, grande abraço
NIcinha
Olá Manuel, boa noite!!
Gosto demais das tuas crônicas, porque além de escrever com objetividade, teus textos tem clareza, e finais inesperados. E da forma como fizeste nesse, em atos, prendeste a minha atenção, do início ao fim.
Corrupção, é o que tem demais aqui no meu belo País...e aí no tua linda Portugal, tem disso também? hehehehe
Muito obrigada pelas visitas que tem feito lá no SEMENTES PRECIOSAS, Manuel, gosto muito!
Beijos da Lu...
Oi,Manuel!Acho que isso não é um problema só ai não se eu entendi corretamente isso acontece e muito por aqui também.
Um ótimo domingo!Beijosss
Existe um lugar onde tudo é possivel.
Onde o amor é verdadeiro.
Onde se acorda em paz…
Onde as flores tem um cheiro especial…
E os abraços vem acompanhados de muito amor.
Este lugar é meu coraçäo…
É neste lugar que eu guardo as pessoas que amo .
E que nunca as esqueço.
Sou feliz por você morar no meu coração.
Com carinho e saudades desejo um abençoado final de semana.
Beijos carinhosos,Evanir.
Amigo sua criatividade é maravilhosa .
O Brasil apesar de ser uma Pais de todas as nações falta muito para acabar com o analfabetismo.
E acontece muitas coisas erradas nas escolas e faculdade que daria uma gigantesca peça de teatro.
Andam, todos os governantes, os deste e doutros calibres, preocupados com a fraca escolaridade dos Portugueses; como não há mais empregos, empregam-se nas ditas Formações. Ora, isto é um desperdício pegado: Formação em diversas áreas, já os Portugueses, que trabalharam, têm.
É só atribuir-se-lhes os Certificados. Créditos, têm a mais.
É com estes "doutores" que a Produtividade se faz elevada nas Empresas Estrangeiras (a restarem poucas que ainda exploram a nossa mão de obra).
Se resulta com Estrangeiros, porque será só haver maus resultados com Empresários Portugueses?
Ou não será assim?...
Abraços
SOL
Um bom dia pra você!
Vim deixar meu abraço, nesse dia de
sol, e agradecer pela presença sempre
carinhosa no meu Cantinho
Parabéns por ser essa pessoa querida
e está comigo sempre
Bjusssss
Rita!!!
Parece que estou no teatro, lendo e gostando, e parece que ouço sua voz
muito gratificante!
Que triste realidade a que vivemos no nosso país... Era bom que isto não tivesse passado de uma história sem um fundo de verdade
Olá Manuel.
Caiu o ano coberto de vergonha e vergonha temos nós por assistir a estas comédias.
Os únicos a quem a vergonha passa ao lado são os chicos espertos que tudo fazem, não olhando aos meios para atingir os fins.
Parabéns pela forma como encenou o "espectáculo". Gostei muito.
Abraço.
Janita
EhEhEh! :-D
A realidade dramatizada fica sempre bem! ;-P
Beijinhos
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