segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Um rabo-de-cavalo







Vou estar uns dias vagueando, por aqui e por ali, numa espécie de férias, mas vou tentar acompanhar os vossos escritos.
Um abraço.



Sabia que gostava dela porque gostava, não sabia explicar porque, nunca fora bom nessas coisas das palavras, era apenas aquela coisa que lhe ia dentro e o sufocava quando ela se afastava, era como um doer que apertava no peito, punha o coração num alvoroço e deixava as pernas numa total tremedeira.

***

Foi numa daquelas tardes parvas, na casa do Afonso, onde entre uns pires de caracóis e umas minis geladas se discutiam trivialidades, que ele a conheceu. Estava numa alegre tagarelice com duas amigas quando, por acaso, os olhares se cruzaram de forma tão diferente, quase antagónicas, ele ficou vidrado, ela numa indiferença quase desdenhosa.

Era linda duma beleza diferente, cabelo amarrado num rabo-de-cavalo, olhos brilhando em reflexos de um azul-turquesa, quase ciano.

As suas gargalhadas eram como água cristalina em suaves gorjeios, o rabo-de-cavalo dançava ao maneio da cabeça em ritmos quase sensuais.

Ele, José Maria, ficou preso na imagem e o coração disparou em batidas fortes e descoordenadas, o pensamento parou no momento do fugaz cruzar dos olhares.

Ela, Raquel, parecia uma daquelas moças para quem a vida é um caminhar feliz e com alegria para distribuir por todos os que faziam parte do seu universo.

José Maria ficou num estado de pura fascinação, perdeu a capacidade de raciocinar, quedou num total aparvalhamento.
Estava nessa quase letargia absorto nos seus pensamentos quando o Rui Pisco o acordou para a realidade:

-Então pá, não comes nem bebes?

Deu um pequeno salto como quem desperta com o susto, olhou com surpresa o amigo antes de responder:

-Desculpa mas não estava aqui, aquela ruiva de rabo-de-cavalo tomou conta do meu pensamento e monopolizou o meu olhar. Que loucura de mulher!

-Quem? Perguntou o Rui, aquela de blusa branca? É a Raquel, moça gira mas não vais ter sorte, acho que tem namorado mas vem que eu apresento-te, as três, e tu desenrascas-te!

Muito deprimente, foi apresentado mas as moças limitaram-se a um "muito prazer" e desapareceram abanando os quatro rabos, mais propriamente três rabos e um rabicho ruivo.

***

Ia começar o jogo da sedução, não sabia bem como isso se fazia mas ia tentar, enviar flores ou bombons, ou quem sabe, fazer uma serenata ou talvez escrever uma carta apaixonada ou, então, dedicar-lhe um poema intenso e vibrante, havia estas formas mas não! Era um problema difícil de resolver. Enviar flores ou bombos era demasiado vulgar, uma serenata impensável, pois Deus não se lembrou dele quando distribuiu o talento, poema só se o pudesse encomendar a alguém mais dotado, ele não sabia sequer por onde começar.

Talvez, pensou, uma jóia mas era um risco pois ela podia aceitar e continuar a ignorá-lo.

Estava a ficar deprimido, não tinha ideias.

Todos os dias, de manhã, ficava especado na esquina da rua até que a visão dos seus sonhos aparecia naquele equilíbrio elegante, nos 14,5 centímetros dos seus saltos, no corpo moldado numas calças de ganga que mais pareciam fazer parte da própria pele, o peito arfava ao baloiçar das passadas, tentando romper a delicada blusa que o cingia. Era, para José Maria, a loucura em movimento, o êxtase dos sentidos, a provocação dos desejos e o sonho de qualquer anjo por mais puro que pudesse ser.

Atirava-lhe um bom dia entremeado de ternura e paixão mas ela, no alto do pedestal, continuava naquela indiferença que fazia doer.

*****

Começou a ficar preocupado, hoje era o segundo dia em que ela não aparecia, talvez tivesse adoecido, coisa normal, mas para ele era um dor no coração pensar que a sua paixão estivesse a sofrer, decerto seria coisa pouca e amanhã já iria aparecer.

Vai passada uma semana e nada de Raquel, a preocupação passou a fazer parte do quotidiano do Zé Maria, tinha pesadelos, sonhava com Raquel a voar num cavalo alado para longe, para bem longe.

****

De repente uma luz brilhou no seu pensamento, o Rui Pisco conhecia a Raquel e, se calhar, sabia o motivo da ausência.

Foi bater-lhe à porta e, azar o seu, o Rui não atendeu, não estava em casa.

Restava procurar no emprego, sabia que ele trabalhava numa seguradora. Ia lá.

O Rui estava de férias de casamento só voltava para a semana.

Não tinha outra solução tinha que aguardar, iria voltar.

Na semana seguinte foi, novamente, procurar o Rui que já estava de volta ao trabalho. Ficou muito admirado com a presença do Afonso.

-Que fazes por aqui Afonso, perguntou Rui.

Afonso procurou as palavras:

-Parabéns Rui, já sei do teu casamento! É alguém que eu conheça?

Rui deu uma gargalhada e respondeu:

-Acho que talvez, casei com a Margarida a irmã do Óscar. Conheces?

Afonso pensou um pouco tentando descobrir, mas não, não sabia mesmo.

-Sabes Rui, há duas semanas que não vejo a Raquel, a ruiva do rabo-de-cavalo, por acaso sabes o que se passa com ela?

-Não faço ideia, desde que estivemos em casa o Afonso, quanto ta apresentei, não soube mais nada dela.
                                                                                                                         

****

Raquel era uma rapariga um pouco enigmática, filha de boas famílias, mas um pouco arreigada a hábitos um pouco ultrapassados. Queria casar virgem e só aceitava namorar quando se apaixonasse verdadeiramente. Já tinha reparado no interesse do amigo do Afonso que o Rui lhe havia apresentado mas, confessava que apesar de ser um homem muito interessante, não tinha feito disparar o clique que esperava.

Quando ele se postava na rua num ar de peralta aparvalhado, olhando-a de forma um pouco “pseudo-conspícua” sentia uma espécie de repulsa, não queria mas era isso que lhe fazia a sua presença.

Começava a estar farta daqueles bons-dias tímidos e da falta de coragem para uma abordagem convincente. Não gostava daqueles tímidos e semi-balbuciados "bons dias".

Não queria ser deselegante, mas já estava a sentir algum desconforto por esta, quase, perseguição.

Ia, tentar, arranjar uma solução que talvez (quem sabe?) poderia resultar.

No sábado foi à cabeleireira, cortou o cabelo, de ruiva passou a loira com reflexos dourados e nada de rabo-de-cavalo, cabelo curto de pontas irregulares.

Olhou para o espelho e gostou do que viu na imagem, estava linda.

Na segunda-feira passou, como sempre, no mesmo local onde o admirador se postava e graças a Deus resultou.

Ninguém lhe disse bom dia.

Afinal do que ele gostava, mesmo, era do rabo-de-cavalo e esse já era.








Deixo esta bela canção dum querido amigo Eleutério Sanches, que não vejo há algum tempo mas que continua no meu coração.


14 comentários:

Sónia da Veiga disse...

Ai que homem apaixonado tão trengo...

Realmente estava apaixonado era pelo rabo-decavalo, mais nada...
Que trsiteza.

Pior p'ra ele, melhor p'ra ela! ;-)

Boas férias Manuel, e que saibam pela vida! :-D

chica disse...

Esse se deu mal...Colocou o amor no rabo,rssr abração,tudo de bom,chica

chica disse...

Esqueci: Boas férias!!!

Anónimo disse...

Amei!!!!
Bjs Manuel

Dina Vieira disse...

Que paixão mais esquisita a dele....
Gostei muito do que li no final até me ri... :)
Beijinhos e BOAS FÉRIAS :)

SOL da Esteva disse...

Só tu, Amigo. Só tu para criares uma obra de expectativas até ao rabo... de cavalo.
No Amor é-se cego pelos mais ínfimos pormenores. Aqui o atestas, com uma paixão apenas por um pormenor da imagem.
Boas férias, Amigo.


Abraços


SOL


Magia da Inês disse...

♡¸.°.¸♫♫♪
Kkkkkkkkkkkkkkkk!!!
Que amor mais fajuto o desse gajo!!!!
Bom fim de semana!
Beijinhos.
Brasil
♡彡♫♪°.¸.•°`

rosa-branca disse...

Olá amigo, mais um final de mestre e que eu estava longe de o adivinhar. Boas férias Manuel e quando voltar quero um daqueles contos, que nem me deixe pestanejar, não vá eu perder alguma letra. Estou a brincar meu amigo. Eu, quase nem pestanejo cada vez que o leio. O amigo tem o condão de me deixar agarrada à leitura. Beijos com muito carinho

Catita disse...

A inteligência da Raquel fez com que se livrasse de um admirador distraído e louco por rabos de cavalo ;)

Boas férias meu caro amigo.

Beijinhos

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido Manuel

Mais uma história maravilhosa e com um final sempre inesperado.
Deixo um beijinho e desejo que as férias sejam boas.

Sonhadora

Evanir disse...

Como estava um pouco afastada estou tentando voltar aos poucos
novamente tentando digerir o desconforto que estou passando no momento.
Eu não posso parar muito menos desistir de lutar como sempre fiz.
E a amizade nos da força sempre para continuar nossa jornada.
Nessa rapida visite convido você a ler minha postagem
também dizer se gostou do novo visual da nossa Viagem.
Lindo final beijos no coração,Evanir.
Estou com saudades de vc amigo.

chica disse...

E as férias?Boas? Relaxa bastante! abração,chica

rosa-branca disse...

Amigo Manuel, continuação de bom descanso. Beijos com carinho


Vivian disse...

Olá,Manuel!!

Ah!Algumas paixões são bem complicadas...ainda mais se não são correspondidas...mas quem já não passou por isso,né?!
Eu que pensei que ia ser solteira pra sempre,sei bem...rs
Mas no fim dá tudo certo!E encontramos a pessoa certa.
Mais um conto surpreendente meu amigo!Beijos e meu carinho pra ti!