sábado, 24 de julho de 2010
A recusa
Pousou os cotovelos no encardido balcão mirou a empregada nos olhos e pediu um café.
Estava nervoso e isso via-se na forma como se agitava, no entrelaçar das mãos e num ligeiro tique nos olhos.
Olhou, mais uma vez, a empregada que de soslaio também o ia observando enquanto maquinalmente ia tirando o café.
-O senhor parece preocupado, atirou ela.
Olhou-a de forma displicente e sorriu.
-Estou um pouco chateado. Sabe? É a vida.
Ela acenou a cabeça em sinal de compreensão, sabia como a vida era difícil.
O homem continuava no canto do balcão, sorvendo o café em pequenos goles e olhando abstracto para um vazio que só ele via.
Era agora ela que parecia agitada, limpando a louça de forma um pouco descoordenada e olhando, de forma um pouco descarada, o cliente que continuava absorto contemplando uma chávena vazia.
Era um homem interessante, pensava Beatriz, enquanto paulatinamente ia arrumando as chávenas que ia retirando da máquina de lavar.
-Vou fechar, disse ela com um sorriso enlevado.
-Quer ir jantar comigo? Atirou ele, com um esgar a fingir um sorriso que não chegou a nascer
Beatriz corou, um intenso rubor tomou conta do seu rosto. Ficou sem saber que dizer, não queria parecer fácil, a vontade dizia-lhe que sim mas a prudência dizia-lhe que não.
Fingiu não ter ouvido o convite na esperança que ele o repetisse.
-Dá-me uma garrafa de água fresca, pediu o homem.
-Aqui está, agora desculpe, mas tenho que fechar o café disse Beatriz.
Ele, com o mesmo trejeito, repetiu o convite:
-Mas não quer vir jantar comigo?
-Mas eu não o conheço! Disse Beatriz com um ar tão cândido que, quase, parecia verdade.
Mirou-a com um franzir de sobrolho, rutilou os olhos num fogacho sem brilho. Atirou umas moedas para cima do balcão e saiu para o escuro da noite que ia caindo.
Beatriz ainda lhe apeteceu fazer a vontade ao que a desejo lhe pedia, quis aceitar esse jantar que o destino lhe colocou no balcão encardido do pequeno café, onde as ilusões morriam diluídas nos cheiros acres dos bagaços que as gargantas ressequidas tragavam em sorvos ligeiros.
*********
Apagou as luzes, fechou a porta e embrenhou-se no breu que a tragou na esquina da rua.
Foi então que uns braços fortes lhe envolveram o pescoço, mal podia respirar e apenas o hálito quente do homem lhe aquecia a nuca e a voz áspera lhe agredia os ouvidos:
-Ouve, minha puta, convidei-te para jantar e apenas o silencio me respondeu. Não aceito negas. Se tivesses vindo talvez te comesse e te deixasse ir à tua vida, mas quisestes ser pudica e agora vais pagar.
*********
Encontraram-na de madrugada, ainda tinha sinais de vida que lentamente se ia esvaindo pelo corte profundo que a havia degolado
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9 comentários:
Manuel
Muito bem contada esta história e muito tocante.
Beijinhos
Sonhadora
AMEI
ler o q escreveu
é sempre um prazer, passar por aqui....
Obrigada pelo comentário no m/blog
é muito gentil......
A ALENTEJANA
VAI VOLTAR
Credo!!!
Que coisa tão macabra p'ra ler num Domingo de manhã esplendoroso!!! :S
São mecos retorcidos como esses que dão mau nome ao género masculino...
Que encontre uma gaja que o cape e se faça justiça!!!
ô seu Manoel ...
É que acontecem tantas coisas comigo sabee.. Fico doente fico boa, meus pais em casa o lugar em que eu estudo, eu preciso de ferias sabe.. ferias isoladas do mundo... Por que vivo sob pressao o tempo todoo ai acabo ficando assim.. Como não tenho amigos perto o blog acaba sobrando... Mas mesmoo assim fiico muuuito grata pela sua atenção e preocupação....
Voce é uma das poucas pessoas que notam isso... Um enomee beeijO e uma abraço bem apertadoo!!!
beijodalua!
tensão no ar...
as vezes a morte é assim... um acaso, um encontro infeliz...
beijo...
Manuel
estes momentos acontecem porque há gente linda como tu...
um beijão
Manuel
que história envolvente, e que assassino gentil...hehehe dá uma chance pra sua vítima.
Ah, e a moça perdeu toda a diversão, ficou só com a parte ruim da coisa...
Não arriscar também pode ser perigoso. E nesse caso, foi.
Gostei do conto, Manuel, e da forma como o conduziu. Manda mais?
Beijo, beijo.
ℓυηα
Caro amigo Manuel,
Quantos casos como este há por aí! Parece que até proliferam e, por vezes, onde e com quem menos se espera... Há que ter cuidado porque muitas cabeças parecem andar a funcionar mal...
Gostei como sempre de o ler, ainda que numa história com um final infeliz, mas a forma como conta estas histórias consegue envolver-nos e tocar-nos.
Beijinho com amizade da Luz
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