segunda-feira, 24 de outubro de 2011

A cantora




Até que a rapariga não cantava mal. Era uma daquelas músicas brasileiras a que a voz doce da artista emprestava uma sensação de cócegas.

As pessoas mais preocupadas com o conteúdo dos pratos, pouca ou nenhuma atenção lhe votavam, mas ela persistia na balada, onde o amor ainda havia de voltar.

Um pouco tímido cruzou os olhos com os da cantora e mais timidamente, ainda, os deixou cair. A voz dela parecia mais doce e a letra da canção era como se fosse só para ele.

Falava de tristezas passadas e de muitas promessas de um amor que iria acontecer.

Havia lamentos e todas as venturas de um dia que estava tão próximo. Falava de beijos quentes, de promessas que pareciam reais.

Ficou enlevado e procurou-lhe os olhos que num largo sorriso o deixou confuso.

Desviou o olhar e o rubor tomou conta do seu rosto, como de um rapazinho envergonhado.

No seu cérebro mil projectos se começaram a desenhar. A que horas sairia? Iria só, ou alguém  a iria esperar? E o sorriso! Meu Deus, aquele sorriso!

Ficou desajeitado como sempre, sem saber tomar uma decisão.

Pediu mais uma bebida, era a terceira e decerto não lhe iria cair muito bem. Não estava habituado mas a ocasião a isso o obrigava.

Em pequenos goles ia ficando inebriado com a letra que, decerto, lhe era dedicada.

Os acordes entravam nos ouvidos e as palavras daquele amor esquecido aqueciam uma existência tão vazia.

Será hoje meu Deus, será hoje
Que o amor vai surgir, assim, de repente
Trazendo tudo o que queroooo
Aquecendo de forma tão boa a alma da gente

Estava enlevado na letra, preso na música.

Quando sua boca me chama
Eu corro apressada
Rebolo consigo na cama
Não preciso mais nada

O pensamento levantou voo, os olhos fecharam-se num doce torpor.

Andou nas nuvens de mãos dadas, vogou ao sabor do vento, rodopiou agarrado aquela delicada cintura.

Beijou aqueles cabelos negros que lhe roçavam o rosto e que o deixavam louco.

Estava próximo daqueles lábios carnudos que em promessas se abriam para ele, já sentia o sabor do beijo quente que se aproximava.

O corpo tremia de prazer.

*********

O sobressalto foi enorme, aquela cara feia tão próxima da sua não era a da cantora.

Acordou assustado com alguém que lhe gritava aos ouvidos:

-Então amigo, acorde que vamos fechar, o espectáculo já acabou há muito!

Só o frio, da noite, o trouxe à realidade.












13 comentários:

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido Manuel

Como sempre os finais das tuas histórias são sempre uma surpresa, porque ficamos embebidos na leitura e não lemos as entrelinhas.
Adorei e deixo um beijinho com carinho.

Sonhadora

Anónimo disse...

"Ah coração leviano não sabe o que fez do meu

Este pobre navegante meu coração amante"

linda diamis esta música!
Bjs Manuel.

Laços e Rendas de Nós disse...

Manuel

Francamente, acha que foram modos de 'acordar' quem sonha?

E não ter ele ficado com algum problema de difícil resolução!

Ai estes homens, quando ouvem uma voz doce, até bebem e adormecem... Vamos lá entendê-los!!!

Beijo

Magia da Inês disse...

°º✿
º° ✿♥ ♫° ·.
É por uma dessas que acredito que o álcool é inimigo do amor...
Beijinhos.
Brasil.°º✿
º° ✿♥ ♫° ·.

Janita disse...

Oh Manuel,
isto de sonhar acordado já é mau e ficar desacordado por causa de um sonho molhado ( em álcool ) é desastroso.
Cá para mim até foi melhor assim...
sabe Deus o que o esperaria.

Um abraço
Janita

SOL da Esteva disse...

Manuel

O teu modo de escrever conduz-nos para dentro da história.
Se a seguirmos como relato, acabamos por nos surpreender pelo imprevisto do final.
Bela arquitectura de escrita.
Parabéns, Amigo.

Abraços


SOL

Ludmila Ferreira disse...

Meu amado você não merece somente um sorriso, mais um sol inteiro, uma brisa gostosa e um leve brilho que diz tudo sem nem precisar olhar....
Desculpa a ausência é que estou me dedicando ao outro blog, que é mais pessoal, por isso que venho lhe pedindo um e-mail, para que eu possa te convidar, lá eu só terei dois seguidores pelo menos eu desejo, que é você e um outro amigo.

Beijo grande para você.

Saudade, adooreii o texto.

Vivian disse...

Olá,Manuel!!

Ah!Meu amigo!!Que maneira de acordar um sonhador!!!
Acredito que o álcool nunca é bom companheiro...se tivesse ficado sóbrio...quem sabe não teria um encontro real...
Um belíssimo conto, sempre á surpreender!!
Beijos!

Pérola disse...

Magnífico em todos os aspectos: estruturais, construtivos e textuais! Adorei seu espaço aqui! (:

Sandra Gonçalves disse...

Amei o texto meu amigo, e o final me surpreendeu.
Bjos achocolatados

Elaine Barnes disse...

Olá amigo! Muito criativo e surpreendente teu conto.Muito bom! Saudades de vc e muito grata pelo carinho da visita viu! Montão de bjs e abraços

PnS disse...

Amigo Manuel,
Que história deliciosa, como sempre plena de suspense e conseguimos viver a história como se estivéssemos dentro da mesma.
Adorei cada detalhe, cada pormenor deste sonho bem regado :)

Obrigada pelas suas palavras em qualquer um dos meus cantinhos ;)

Beijo com carinho

chica disse...

Teus contos sempre lindos e nos prendem até os finais, onde já me preparo para as surpresas,rs abração,chica