quinta-feira, 3 de julho de 2014

Mulheres!











Juro que não aguentei mais, alcei a mão e espetei-lhe um bofetão, nas ventas, que o deixei a ouvir o pipilar de milhentos passarinhos.

Sabem que eu tentei aguentar, fiz mesmo esforço e, quantas vezes mudei o caminho, para não me cruzar com o bandalho.

Mas hoje o tipo passou, com andar gingão, quase provocador, foi a gota. 

Ainda tentou levantar-se e tirar desforço mas, o bico da  bota, deixou-o a sonhar por muito tempo.

Já fomos amigos, mais propriamente, quase família, porque amizade é algo de diferente.

Ele é, ou era, casado com a minha irmã Matilde, que devido aos maus tratos e não querendo denunciar o canalha, pegou na filha e desapareceu sem dizer nada, nem ao próprio irmão. Teve receio, não sabia que ia estar, aqui, do seu lado, que a iria proteger com a própria vida.

Agora ela, e a minha sobrinha, está sabe Deus onde! Tudo, por causa de brutamontes que a enganou, com falinhas mansas, até casar.

Depois começaram os maus tratos, agressões físicas e psicológicas. Os vizinhos bem me alertaram, mas ela negava sempre, o medo tolhia-lhe a fala.

Comecei a guerra, não ia dar paz aquele sujeito, chegou a hora de evitar cruzar-se no meu caminho, porque eu, juro, que dou fim à sua vida.


Hoje, de manhã muito cedo, dois polícias bateram à minha porta, mostraram-me um papel, que não cheguei a ler, e com voz simpática pediram para os acompanhar à esquadra.

Mas, perguntei:

-Acusado do quê?

O mais alto dos polícias, respondeu:

-Está aqui no mandato, mas é acusado de agressão a um indivíduo do sexo masculino. Está no hospital, com o nariz e duas costelas fracturadas. Será que não se lembra?

Já sabia, aquele bastardo ficou marcado. Ainda bem, não se iria esquecer nunca mais!

Passei a noite na esquadra, na manhã seguinte mandaram-me em paz, não foi muito grave, a vítima, como eles diziam, não apresentou queixa, só tinha que pagar, possivelmente,  a conta do hospital.

Sou um pouco impulsivo, nada de violento, apenas me deixo levar pelas emoções. 

Não estou arrependido, ele merecia, só que talvez, tenha abusado um pouco da minha força.

Ando na dúvida, não sei se devo ir ao hospital, afinal é o pai da minha sobrinha, ou esperar que o tempo passe e confiar que tenha aprendido, duma vez por todas, a lição.

No fundo, eu, até sou um coração mole. Capaz de partir a louça toda e no momento seguinte estar, totalmente, arrependido.

Vou, mesmo, ao hospital saber como está o gajo, no fim acabo por ser eu a pagar a estadia!

A menina da recepção, pelo nome, informou-me que já tinha saído, o médico deu-lhe alta.

Parece que não foi assim tão grave, só ficou uma noite e um dia.
Penso que, no fundo, até fui meigo devia ter-lhe amachucado o canastro mais um pouco.

Vou lá a casa, vou ver se o traste precisa de alguma coisa.

Quando toquei, à campainha, estranhei o resfolgar de uns passos de criança a correr no corredor, ouvi igualmente, a voz da Matilde a gritar:

-Espera Ritinha, não abras sem a mãe ver quem é!

Espreitou e abriu a porta, com maus modos, foi dizendo:

-Que queres desgraçado? Vens acabar a tua obra? Desaparece que eu trato do meu marido!

Fiquei sem saber o que fazer, não queria acreditar, só lhe consegui dizer:

-Posso dar um beijo na minha sobrinha?

Sem, sequer, me olhar respondeu:

-Dá e desaparece!

Mulheres!

Nunca as vou compreender!







15 comentários:

Unknown disse...

Manelamigo

Só se perderam aquelas que caíram no chão. A um sacana desses houve alguém que lhe chegou a roupa ao pelo.

Matar o pulha só dava trabalhos para quem o matara e trabalho para os cangalheiros.

Mas - e aí está a adversativa fdp (por extenso, filha da puta) - dar uma carga de porrada num sabujo é uma coisa; entender as mulheres é outra e bem diferente.

Não se pode esquecer o dito popular: quanto mais me bates, mais gosto de ti; isso sim, isso é de... mulher

Abç

Queres conhecer Caxemira sem pagar bilhete nem visto? Então, vai à Travessa de onde andas muito arredado... Imeiles - não chega!!! :-) :-) :-)

chica disse...

Que maravilha de conto, tão bem contado que parece verdade! Adorei e que pena que existem mulheres que apanham, são maltratadas e ainda assim, ficam ao lado do desgraçado pra defendê-lo... abração,chica

Gina G disse...

Eu ia dizer 'quanto mais me bates mais gosto de ti' mas já alguém se adiantou...

Beijinhos

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

confesso que gosto de ler os teus contos, pois os fins são sempre completamente imprevistos, e este tb foi.

mas e como acima já disseram "quanto mais me bates, mais gosto de ti", há coisas que não vamos entender nunca.

beijinho

:)

Evanir disse...

Mais que uma mão estendida
mais que um belo sorriso
mais do que a alegria de dividir
mais do que sonhar os mesmos sonhos
ou doer as mesmas dores
muito mais do que o silêncio que fala
ou da voz que cala, para ouvir
é, a amizade, o alimento
que nos sacia a alma
e nos é ofertado por alguém
que crê em nós.
Sua amizade e carinho mesmo
que você não acredite me faz um bem
enorme.
Deus abençoe seu final de semana
deixo aqui meu carinho e todo sentimento ,
mais puro que trago na alma.
Beijos no seu lindo coração.
Evanir.

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Aqui, na terra brasilis, costuma-se dizer: "bate-me que eu gamo'!Conheço algumas Matildes e acho-as idiotas. Foi criada há alguns anos a Lei Maria da Penha, para punir esse tipo de homem. Acontece que muitas mulheres não denunciam os seus maridos...são "gamadas" neles. Gostei da atitude do cunhado mas, matar nunca. O Ferreiramigo fez um comentário pra valer. Suas crônicas, Manuel, retratam tão bem a realidade...adoro!
Um beijo, querido amigo,
da Lúcia.

P.S. A minha velha Cadeirinha, pegou "cupim" (vírus) e, por isso, está passando por uma severa DESCUPINIZAÇÃO. Volto em breve, a publicar. Estou pesquisando sobre o CRATO brasileiro-cearense que herdou o nome do Crato lusitano.
Até...

Maria Luisa Adães disse...

Manuel

Tanto me encanta tua presença e tua forma, tão tua, de me saudar!

Teu texto tem a cor da vida, do quotidiano de cada um e está, acima de tudo, muito bem escrito!

Abraço,

Maria luísa

dilita disse...

Olá Manuel!

Chego sempre atrazada... Nem vale a pena procurar desculpa.

Primeiro um abraço de felicitações pelo aniversário do Blog.
Está crescidinho, mas muito jovem ainda, e por isso com a obrigação de continuar a trazer-nos os habituais contos, dos quais já não prescindimos.
Expresso-me no plural, porque tenho a certeza que está correto.

Gostei muito destes ultimos contos; este Mulheres, até deu para sorrir. Não esperava aquele final... Mas há casos destes na vida real. Não percebo que raio de amor se possa sentir depois de apanhar cacetada.Como dizia o Solnado - enfim, gostos...

Abraço, e bom Domingo.
Dilita

SOL da Esteva disse...

É um Conto com traços da realidade. Há imensas Matildes (a maioria, infelizmente) que opta pelo silêncio e até pelo retorno.
A moral da história é que (parece) o crime compensa... quase sempre.
Gosto, Amigo, do modo como contas.


Abraços


SOL

Mirtes Stolze. disse...

Bom dia Manuel.
Não sei se é realidade ou ficção,mas retrata com certeza a realidade, não sei como uma mulher se permite tamanho absurdo, tive uma irmã bem economicamente, não precisava de nada do traste com quem se casou, a nossa família a apoiava totalmente, ela o conheceu com 13 anos e ele com 44 anos, e assim viveram entre tapas e beijos por muito anos, a 6 messes ela deu o basta, e depois de um més apareceu morta em seu apartamento, sem sinas de arrombamento, em resumo ela perdeu uma linda vida, tinha tudo para seu feliz e ate hoje eu me pergunto como entender essas mulheres que se permite ser tratada assim, e ainda pior se afastam da própria família para que não presencie o seu espancamento, nunca entenderei.
Um feliz dia.
Abraços.

Sandra Gonçalves disse...

Muito bom teu conto meu amigo, desculpa estar sumida, mas aos poucos vou voltando a visitar os meus queridos e doces amigos assim como tu. Amei ler-te de novo, sempre fostes minha inspiração. Bjos achocolatados

São disse...

Mulheres, não. Que as generalizações são sempre injustas , meu amigo.

Que só se perderam as que caíram no chão, sem dúvida.

Quanto à mulher em questão, está doente psicologicamente, coitada.


Um bom resto de domingo


Maria Luisa Adães disse...

Manuel

Isso das mulheres e maridos, é impossível de entender e quem se mete, fica mal...

O melhor é deixar e esquecer, mas o texto está muito bem delineado, aliás, como apanágio seu.

Espero que tudo esteja bem! Abraço amigo,

Maria luísa


Unknown disse...

Boa noite, Manuel.
Este seu texto relata tão bem tantas uniões de violência/amargura/idas-e-voltas - que não dá para entender.
Por essas e outras é que fica difícil uma pessoa de boa fé ajudar, porque nunca sabe onde se está a meter. As pessoas, não as mulheres, são sempre complexas.
Abço amigo

Afrodite disse...


O que escreveste vem provar que o que separa a realidade da ficção é apenas uma linha muito ténue.

Quanto ao teor do enredo que construíste... só posso dizer: Vidas!! :(


Um beijinho "de faz de conto"
(^^)