sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A Promessa



Dona Emília estava orgulhosa do seu almoço, pois as visitas estavam deliciadas.
-Nunca tinha comido um arroz de pato como este, exclamou Vicente.
-É bondade sua menino.
-Não é Dona Emília, está mesmo divinal.
-Bem os patos eram bons, o chouriço é do nosso e o forno de lenha ajuda.
-Não seja modesta, pois sem a arte das suas mãos não seria possível esta iguaria.
-Fico sem jeito com tanto elogio, mas já o seu mano, o menino Jaime, também delirava com o nosso arrozinho de pato.
O Jacinto raspava, sem cerimónias, os restos do prato enquanto o seu pensamento estava longe, bem longe.
Desde que Mafalda tinha feito as malas e saíra de casa, sem qualquer aviso, a sua vida tinha mudado totalmente. Andava apático e, aceitara este almoço porque a insistência do Vicente foi muita e também aproveitava para matar saudades da herdade onde cresceu e onde se fez homem. Foi aqui que conheceu Mafalda, naquele Verão em que o irmão convidou os amigos de Lisboa para um fim-de-semana no monte. Desde o primeiro momento sentiu que o destino lhe tinha posto aquela mulher no seu caminho.
A atracção foi mútua e quando deram por isso estavam em lua-de-mel.
Foram dois anos intensos de paixão quando de repente, Mafalda, apanhou o avião e partiu para Paris.
Nunca fora homem de desaforos, mas saber que a mulher tinha, sem explicações, acabado com dois anos de felicidade para fugir com um homem 20 anos mais velho era difícil de aceitar. Não sabia o que mais lhe doía se era ter sido abandonada ou ser trocado por um gajo qualquer. Que poderia ter esse fulano a mais, que Jacinto não tivesse?

Mafalda sempre esteve no lado bom da vida. Filha tardia de um abastado diplomata, cresceu cumulada de todas as atenções, menina mimada a quem a vida tudo deu. Foi uma boa aluna, estudou nos melhores colégio da Europa.
Quando acabou a licenciatura em Línguas, pensou em viver em Londres mas cedo mudou de ideias, pois o clima e a frieza britânica não se coadunavam com a sua personalidade.
Voltou a Portugal e conheceu o Jacinto. Foi, realmente, amor à primeira vista, tinha encontrado o homem com que sempre sonhara. Calmo, apaixonado, aventureiro. Foi tudo tão inesperado que quando deram por isso estavam casados. Viveram numa loucura total, numa constante procura do desconhecido, passeios pelos cantos mais misteriosos do mundo, o encanto das descobertas, o fascínio do exotismo oriental. Fizeram amor em cabanas no alto de grandes montanhas, em praias paradisíacas, foram felizes nos locais mais recônditos do mundo.
Prometeram que só a morte acabaria com essa loucura.
Viveram, em dois anos, uma existência, uma vida. Foram felizes sem perguntas, sem regressos ao passado.

Tinham acabado de chegar do Quénia e numa recepção na Embaixada conheceu o doutor Viriato, homem maduro e com um encanto no falar que a deixou totalmente fascinada.
Tinha uma experiência de vida que a perturbou, falava de tudo com um conhecimento sábio, com um encanto perturbador.
Quando ele lhe disse:
-Amanhã vou jantar ao La Coupole em Paris. Quer vir comigo?
Apenas lhe saiu:
-Claro que quero!

Deixou a mesa e com pressa dirigiu-se ao carro.
-Onde vais com tanta pressa? Perguntou Vicente.
Jacinto parou, olhou o infinito e com um sorriso respondeu
-Vou a Paris fazer cumprir uma promessa.


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