quarta-feira, 15 de julho de 2009

Onde estás?



Passou por mim olhando de lado. Eu sabia que estava zangada, não gostou do que lhe tinha dito. Mas eu também não gosto que ocupem o meu lugar no sofá. São manias, sou assim. Que fazer? Também tenho os meus direitos e não me posso subjugar a tudo o que ela quer. A culpa é toda minha, pois o excesso de mimo conduz a estas situações.

Saiu para o jardim e não olhou para trás como de costume. Eu sei que não tarda. Vai passar e volta cabisbaixa como se não fosse nada com ela. Deve ser o facto de nem sempre me impor como devo. Tenho que passar a ser mais firme e a deixar bem claro que sou eu quem manda.

Começo a ficar preocupado, pois do jardim passou para a rua é já passaram cinco horas e não há sinais da Alice. Não é que seja de me preocupar grandemente, pois já fez o mesmo por diversas vezes, desaparece e só volta quando lhe dá nas ganas. Mas um dia vai-se sair mal. Vai, podem crer!

É muito ciosa dos seus direitos e se altero um bocado a voz, amua e pronto, desaparece convencida que me está a castigar. Um dia perco a cabeça e as coisas, aí, vão mudar de figura. Faço como um amigo meu que fechou, a dele, na cave durante alguns dias e parece que a coisa resultou. Diz que agora está muito mais meiguinha.

Queria evitar, pois eu sou contra os radicalismos. Julgo que não é necessário chegar a esses extremos. Penso eu!

Agora as coisas começam a ficar mais complicadas, e, confesso alguma preocupação, pois já vai um dia e sem aparecer. Por tanto tempo nunca sucedeu. Será que lhe aconteceu alguma coisa? Nem quero pensar nisso!

Já estou arrependido por ter alterado a voz, mas temos que mostrar quem manda, pois se nos tomam a fraqueza não tarda abusam.

Se conhecessem a Alice provavelmente não me estavam a condenar. Mas não conhecem! Não sabem o que é ser convencida e teimosa.

Há três dias que não aparece. Já fui á polícia. Foram muito simpáticos, mas pouco ou nada podem fazer. Aconselharam-me a por um aviso nas montras, a pedir ajuda das pessoas conhecidas. Acho ridículo e não o vou fazer.

Já cinco dias e nenhuma notícia da Alice. Estou a ficar muito, mas mesmo muito, preocupado. Não sei que fazer mais. Já percorri todos os locais onde sei que ela gosta de ir. Já mobilizei todos os amigos para me ajudarem na procura, já pedi todas as ajudas possíveis e nada. Não aparece.

Estou a precisar de ajuda, ando muito preocupado, pois perder a minha única companheira é muito difícil. Passo os serões a olhar para a televisão sem nada ver. Aquele lugar vazio no sofá é angustiante.

Ouvi algum reboliço no jardim. Devem ser os gatos da minha vizinha. São dois bichos desinquietos e que estragam os meus melhores canteiros.

Pareceu-me ouvir bater na porta. A estas horas quem pode ser?

É ela! Magra, suja e com um ar tão submisso que me espanta. Olha para mim de uma forma suplicante e abana a cauda num ar de humildade que me deixa, deveras, espantado.

Mal abro a porta disparou em direcção á ração, que detesta. Rapou a tigela até ao fundo e olha para mim implorante, como que a pedir mais.

Não comes mais, tens que ir tomar banho. O susto que tu me pregastes.

Anda cá maluca.