domingo, 28 de dezembro de 2014

Diálogos.......

  







Um ano novo está à porta, deixemos a tristeza e vamos tentar um sorriso:






Todos nós conhecemos uma Maria Inês. Eu conheço uma que, por vezes, serve para estes meus escritos.







Escutem este, entre mãe e filha:


-Mãe…oh mãe.

-Que é rapariga? Essa gritaria toda para que?

-Que dia é hoje?

-Sexta-feira. Porquê?

-Não é isso, Que número de dia?

-Oh rapariga, dás comigo em maluca. Hoje é dia 4. Que se passa?

-Porque estou lixada! Esta gaita já está oito dias atrasada.

-Já fizestes asneira? Esse teu juízo, ou melhor, falta dele não te auguram nada de bom. Eu já estava admirada que isso só tivesse acontecido agora. Não prestas para nada, a não ser para me dares desgostos!

-Mãe não seja assim. Oh pá… são coisas que acontecem. Eu sou gira e tenho que viver a vida.

-Desgraçada! E quem é o sujeito que te fez isso?

-Sei lá! Pode ser o Augusto, o Gilberto, o Vítor, o André ou o Ricardo.

-Valha-me Deus! Ao que o mundo chegou. E agora o que pensas fazer?

-Sei lá! Agora vou fazer uma dessas cenas para ver se estou grávida. Depois ou estou ou não estou.

-Isso é uma verdade de Monsenhor La Palisse

-Que merda é essa do tal Monsenhor?

-Esquece! Se tiveres prenha que pensas fazer da tua vida? 

-Ora vou ganhar umas massas. Cada um dos gajos dá-me pasta para a parteira. Recebo de cinco e pago um, logo fico a ganhar quatro. Se não estiver, digo que estou, eles pagam na mesma e ainda ganho mais. Diz lá que eu não sou esperta?

-Meu Deus criei um monstro!










-Mãe, há muitos pais Natal? Perguntou Clarinha.

A mãe ficou um pouco preocupada, não sabia bem como responder. A menina tinha apenas seis anos e ainda vivia o sonho, lindo, de acreditar no Pai Natal, no trenó e nas renas. Não queria que a filha perdesse, tão nova, toda essa magia.

- Que pergunta, Clarinha, então não sabes que Pai Natal só há um!

- Mas insistiu, a criança, eu já vi tantos e eram, todos, diferentes. Vi um gordo à porta da loja dos brinquedos, depois vi um magrinho na esquina da rua, das casas bonitas, estava a fumar e o Pai Natal não devia fumar. Pois não, mãe?

Maria do Carmo pensou quanta falta lhe fazia o marido, ele saberia explicar bem todos estes porquês, mas algo o chamou e ficou ela e a filha.

Foi difícil, não estava preparada para ser pai e mãe ao mesmo tempo e muito menos para  ter tantas carências que a estavam a atirar para situações que, na verdade, não queria, mas tinha que alimentar a magia do Natal no sonho da filha:

- Sabes, Clarinha, que só há um Pai Natal, é o que vem deixar as prendas ao meninos e meninas que se portam bem, os outros que estão por aí, são a fingir para enfeitar as lojas.

- Mãe, voltou a criança, e eu portei-me bem, não portei?

- Muito bem meu amor, és uma menina muito especial. Respondeu a mãe.


*****


Foi num domingo, de Maio, estava um Sol que convidava a um momento de laser no bar à beira mar.

Maria do Carmo pediu um gelado, não conseguia resistir a duas bolas, regadas com um licor de chocolate, e foi sentar-se numa mesa ao fundo da esplanada.
Com muito cuidado, parecia uma criança, ia tirando porções muito pequenas, para o fazer durar mais. Era um quadro lindo, a colher deslizava suavemente, tentando segurar uma fina tira de sorvete, com algum licor, que depois com os olhos semicerrados, deixava derreter de forma, quase sensual, na língua. 


Na sua frente, Albano, estava fascinado com o gesto, com o encanto sedutor da imagem. Era digno de ser visto, uma mulher linda num êxtase total, absorvida no delicioso sabor de um sorvete que ia deixando, muito lentamente, derreter na boca, de forma, quase, sensual.

Não resistiu, era demasiado, Foi comprar um gelado, aproximou-se e delicadamente sussurrou:

- Há imagens que ficam comigo para sempre, tem magia.
É difícil descrever este momento, queria ficar com ele eternamente! 
Posso sentar-me e fazer-lhe companhia neste momento tão especial?

Maria do Carmo corou, não pensava estar a ser alvo de atenção. O moço era giro e parecia simpático. Porque não? 

- Esteja à sua vontade, respondeu, a mesa não é minha e esqueci que não estava só, deixei-me levar pelo prazer que um bom gelado, sempre, me provoca.

Albano sorriu, tinha um sorriso saudável, dentes perfeitos nuns lábios desenhados por um artista, os olhos de uma cor indefinida, pareciam cinzentos, e altamente sedutores. 

Tentou continuar o diálogo:

- Sabe menina, desculpe, não sei o seu nome!

Ela quis hesitar mas respondeu:

- Maria do Carmo, mas não importa o meu nome, tenho que ir embora!

- Lindo nome! Elogiou Albano. Mas só podia ser assim, para condizer com a dona! Não vá já embora, vamos prolongar este momento, de prazer, até acabarmos os nossos gelados!

Não pode evitar um sorriso antes de responder:

- Também não sei o seu nome e não me importa! Mas não se arme em sedutor barato!

Ele corou e quase gaguejou ao responder:

- Desculpe, tem toda a razão, fui importuno e sem princípios! Sou o Albano e juro que não sou nada do que diz, foi uma atracção natural e sinto que também não lhe fui indiferente.

- Oh! Exclamou ela, também é convencido e pretensioso! 

- Não diga isso! Suplicou Albano.

Depois foi um amenizar da conversa, os sorrisos que dizem mais que mil palavras, os gestos simples e a cumplicidade que alicerça os sentimentos.


******


E foi assim, desta forma simples, que começou uma história de amor. 
Momentos de ternura, caminhar de mãos dadas, promessas feitas no calor da paixão, juras eternas e compromisso de um seguir juntos, até que Deus os separe.


Foi um namoro de seis meses, casaram em Dezembro, não estava previsto, mas naquela manhã, Maria do Carmo deu a novidade:

- Amor estou grávida!

Albano ficou tão feliz que apenas lhe saiu:

- Vamos tratar já do nosso casamento! Vamos construir o nosso lar, para receber o nosso filho quando nascer.


******


Foi em Julho que Clarinha abriu os olhos ao mundo.
Disseram, logo, que tinha os olhos do pai e a boca da mãe.

O casal continuou, no mesmo encanto, o amor foi dividido por três, ninguém notou a diferença, eram felizes.

Estavam, novamente, em Maio. Iam fazer seis anos que se conheceram naquela esplanada à beira mar.
A Primavera,  prometia as tardes quentes, havia no ar um certo lirismo. É natural na estação das flores, o romantismo, convida ao amor.

****

Albano estava com um ar nostálgico, Maria do Carmo, apercebeu-se. Não era normal, estava sempre tão alegre. 
Tentou, com carinho:

- Que se passa amor? Compartilha, comigo, os teus pensamentos!

Albano pareceu acordar, daquela espécie de letargia, e lembrou à sua amada:

- Sabes que faz amanhã seis anos que nos conhecemos? Recordo com muita saudade aquele momento mágico.

- Não esqueci! Confessou Maria do Carmo.

- Sabes o que vou fazer, disse Albano, vou à gelataria, comprar dois gelados, de duas bolas regadas com chocolate. Temos que comemorar aquele encanto.

*****

Saiu porta fora, vai fazer amanhã seis meses.
Não mais apareceu, nem em casa, nem no emprego.
A polícia já tentou tudo. Mas mesmo tudo.

E nada!

Nunca mais voltou, não mais deu sinal.

Desapareceu como se tivesse evaporado no espaço.

Mas, Maria do Carmo, continua à espera, o coração diz-lhe que ele, um dia, de repente, vai aparecer com dois gelados, de duas bolas, com creme de chocolate.











16 comentários:

Unknown disse...

Manelamigo

Tudo o que escreves - escrevem; ou melhor, muito bem. Estes "apontamentos" que hoje publicas são um achado; e ainda por cima, bem escritos.

Daí te digo que és realmente um ESCRITOR, um tanto enviesado, complicado, em busca de soluções que são feliz e geralmente optimistas.

Mas fazes, inventas, enredos, sequências, cenas que fazem com estejamos a assistir a um espectáculo. De sombras? Nada; de realidades, por vezes fingidamente virtuais.

Não sei que mais te diga. Porque és (quer queiras, quer não queiras...) um ESCRITOR. Pronto. Ponto.

Abçs - a caminho de um 2015 que se quer menos desgraçado.

Unknown disse...

ADENDA

Já se encontram em algumas livrarias exemplares das "Crónicas das minhas teclas". Parece-me uma boa altura para o comunicares, se quiseres e fizeres o favor, através do "navoltadotempo", por imeile, Feiçebuque" ou outro que tal. Deste já muito obrigado


Abç

Janita disse...

Gostei tanto da canção do Abrunhosa, uma das minhas favoritas, quanto me desgostou esse diálogo, escabroso, entre mãe e filha.
Desculpe mas não consegui sorrir, como o Manuel alvitrou.

Abomino pessoas que vivem de expedientes, sempre prontas para passar rasteiras aos outros, não olhando a meios para alcançarem os seu abomináveis fins.

FELIZ ANO NOVO, Manuel!

Que a vida lhe traga tudo o que mais precisar.

Janita

Unknown disse...

O diálogo entre mãe e filha se torna interessante justamente por sabermos que existem realmente situações assim, onde a esperteza fala mais alto do que a decência e os bons costumes.
Endosso a opinião do Henrique Antunes Ferreira ao dizer que tu és realmente um ESCRITOR, pois teus escritos tem-nos dado provas disto.
Agradou-me o vídeo desse cantor que conheci através dos blogs dos amigos portugueses. A canção é linda, uma letra belíssima, tal um poema.
Deixo-te esta prece irlandesa como a desejar-te um ano de 2015 recheado de tudo aquilo que precisares para trazer no olhar as estrelas que formarão sorrisos no teu rosto.
“Que o caminho seja brando a teus pés, o vento sopre leve em teus ombros, que o sol brilhe cálido sobre tua face, que a chuva caia suave sobre seus campos e até que nos encontremos de novo, que Deus te guarde na palma da Sua Mão.”
Meus respeitos, admiração e carinho,
Helena

Unknown disse...

Manuel...Manuel...Andas a ouvir muitas coisas descabidas...será que também estás nos rol dos...
Bem ficamos assim e não digo mais nada antes que me contes também nesses tais que foram amantes dessa coitadinha, inocente e sabidona...

Votos de um ano - 2015 Muito bom

chica disse...

Mais um lindo momento de leitura nos ofereceste aqui,Manuel! QUe diálogo!!!!!!

Desejo um lindo e feliz 2015! abração,chica

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Larguei Da Cadeirinha,atravessei o Atlântico (a jato), só para desejar-lhe um grandioso Ano Novo e me deparo com um "diálogo" de peso!

Feliz 2015, Manuel!

Evanir disse...

Foi um privilégio caminhar a seu lado no decorrer desse ano .
Estou passando na minha última visita de 2014 e
agradecida por um dia ter conhecido uma
pessoa tão maravilhosa como você.
Nunca terei como agradecer seu companheirismo
que fez você ser tão espacial para mim.
Que essa amizade compartilhada no percurso
de mais um ano seja a alavanca para prosseguir em mais um ano.
Desejo um ano novo de grandes conquistas sonhos que se realize paz e esperança .
Sem despedidas deixo um encontro marcado para compartilhar novos momentos...
Agradeço esse presente divino que tem o nome de amizade.
Feliz Ano Novo.
Até nosso próximo reencontro em 2015.
Beijos ternos e carinhosos.
Evanir.

Gracita disse...

Boa noite Manuel
Sempre muito bem delineado os teus contos e este soberbo!
Os dias do novo ano serão sempre iguais cabe a cada um de nós promover mudanças internas que nos possibilitem vivem em comunhão tecendo junto com nossos pares momentos de alegria distribuindo por onde passarmos pétalas de amor. Desejo que você tenha 2015 motivos para sorrir e a nova página que está se abrindo para ti seja preenchida com alegria, amor e grandes realizações. Tudo o que há de melhor é o que desejo para você e sua família.
Um FELIZ ANO NOVO de muito SUCESSO
Abraços

Smareis disse...

Dialogo brilhante Manuel.
Tu é bom em tudo que escreve. Um excelente escritor.
Desejo um 2015 recheado de coisas boas.
Beijo!
Feliz Ano novo!

SOL da Esteva disse...

Sabes, Manuel. O que escreves parece ter a simplicidade mas é factual. Na verdade há muito de sabedoria no modo e na forma.
É, sempre, delicioso ler-te.
Que o 2015 te traga a continuação dessa "fertilidade" que rende "Contos".
Parabéns.
Que o Novo Ano te seja benévolo e de felicidade.


Abraços


SOL

Magia da Inês disse...



Com uma história dessas é fácil rir.

FELIZ ANO NOVO ♫♬° ·.
HAPPY 2015!!!
ིه° ·.

Mirtes Stolze. disse...

Boa tarde Manuel.
Feliz 2015 que os seus sonhos sejam realizados, muito bom interagir com você em 2014, agora vamos , que vamos o próximo ano está chegando, confesso meu amigo a minha alegria é que esse ano está acabando.
Feliz 2015.
Beijos.

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido Manuel

Que o ano de 2015 seja pleno de amor e felicidade...de paz e fraternidade...repleto de realizações e de sonhos concretizados.
E mesmo se as mãos estiverem vazias...que a esperança seja um sorriso esperando pelo futuro e iluminando o caminho para que a vida seja um suave tapete de pétalas e todos os dias do Novo Ano se pintem com o azul de uma serena madrugada.

E obrigada pelo carinho e amizade que me aquece o coração e me dá alento para continuar a minha caminhada.

FELIZ ANO NOVO
Um beijinho
Sonhadora

Ricardo Santos disse...

Hoje tudo é possível, até mesmo uma histórica verídica como essa que contas.
Bom Ano de 2015 Manuel !

Vivian disse...

Caro amigo...ainda não sei se choro ou sorrio...este diálogo dá calafrios! É bem realista.Pessoas assim,infelizmente existem...

Beijos!