terça-feira, 26 de maio de 2015

O segredo














Não lhe apetecia falar, não o podiam obrigar, por isso, ia ficar mudo como uma mosca morta.

Ele estava atento e percebia a forma indirecta como o abordavam, sub-reptícia e camuflando as intenções. Mas estava preparado para tudo e nem com ameaças ou promessas ia abrir a boca.

A verdade é que não sabia nada mas, os outros, pensavam que sim e ele alimentava essa convicção, sentia-se importante e gostava.

Fazia um ar circunspecto, misterioso e, por dentro, ria com o gozo da situação.

A mãe era a mais descarada, não fingia, era directa e insistia:

-Mas Raimundo porque não conta tudo à mãe?
Podes confiar em mim que eu não digo nada a ninguém! Em que problema estás metido, filho? Já sabes que a mãe te ajuda!

Sorria. Um esgar, um pouco sacana, mas era o suficiente.

-Mas o queres que conte? Sabes, bem, que não posso, fiz uma promessa! Concluiu Raimundo, com uma gargalhada.

Ao jantar ele percebia os olhares da irmã, até parecia ouvir-lhe os pensamentos, pareciam moedas tilintando num bolso imaginário. A irmã, Mónica, só pensava no dinheiro que lhe podia render, se soubesse, o que julgava que ele sabia.

Não se importava nada de esmifrar, fosse quem fosse, para estar calada e não badalar se isso desse algum lucro.
O parvo do irmão devia saber tudo, sabia quase de certeza, senão a agitação que percebia, nos outros, não fazia sentido. Não sabia o que era, o que podia ter acontecido mas, tinha a certeza, que era um grande furo que podia dar umas boas notinhas.

O irmão era um parvo, dos grandes, se fosse esperto partilhava com a mana e ela se encarregava de sacar umas massas e, ele, podia continuar a fazer o papel de santinho, bem comportado. Mas o tipo não confiava e não sonhava alto.

Ela já tinha o filme todo, feito na cabeça, ou a mãe tinha posto um par de chavelhos no pai, ou o contrário, o pai andou em algum enrolanço e o gajo topou.

Havia de descobrir, não sabia como mas ia conseguir saber tudo.

Agora havia uma coisa que lhe bailava na cabeça, se o pai e a mãe pareciam receosos era porque não estavam tranquilos, alguma tinham feito.

A mãe não acreditava muito, ela tinha olhos de quem gostava mas, dai a fazer uma escapadinha não lhe parecia. Já o pai era capaz de tudo e um pouco mais, ela topava os olhos dele e a forma como se babava quando a vizinha, do andar de baixo, estava à janela com as mamas a quererem saltar pelo decote.

******

Raimundo estava metido num sarilho, começou com uma brincadeira, parva,  mas uma brincadeira.

Um dia chegou a casa com cara de caso, ar enigmático e um bocado misterioso.

A mãe, sempre atenta aos filhos, perguntou:

-Raimundo que se passa? Parece que vistes alguma aparição!

Fingiu um ar compungido, coçou a cabeça, junto à testa, e deixou sair com um suspiro:

-Ai mãe se eu pudesse falar! Mas não posso porque muitas desgraças podiam acontecer.

A mãe ficou arrepiada, mas pensou que fosse mais uma aparvoada do rapaz e não ligou.

Raimundo arrependeu-se mas estava dito e, agora, nada havia a fazer.

A irmã, ele bem a ouvia, entrava no quarto às escuras e ia vasculhar-lhe a roupa, mirava todos os papéis na esperança de encontrar uma pista. Ele fingia dormir enquanto abafava um riso de gozo. Era lixada, não vendia o pai e a mãe, porque sabia, que ninguém os comprava.

O pai está na fase de só gostar de ver e a mãe no deixa andar, já não têm mercado.

Raimundo está, como que entalado, meteu-se em trampa, até ao queixo, e agora esta com medo das ondas, para não se engasgar com a agitação da maré.

Mas já que que começou vai aguentar, o máximo, até dar, depois alguma coisa deve acontecer, logo se vê.

*****

E aconteceu, coisas do acaso ou desígnios de Deus, mas a verdade é que o pseudo segredo, do Raimundo, acabou por acontecer.

********

Foi por acaso, ouviu o som de mensagem no telemóvel da irmã, não devia, mas foi espreitar e antes não o tivesse feito, pois ficou a saber o que não queria.

Mas agora tinha um segredo, não estava feliz, mas tinha acontecido e o segredo existia.

******

Foi no Domingo, os pais foram à missa, iam sempre à das nove horas. Não era, propriamente, por devoção  mas parecia bem e era uma forma de socializar com as pessoas chiques.

A irmã, como sempre, foi a ultima a sair do quarto, desgrenhada e com os olhos inchados de dormir.

-Até que enfim que te levantas, disse Raimundo, estava a ver que fazias uma directa!

Ela, esfregou os olhos, antes de responder:

-Sabes menino quais são as duas melhores coisa do mundo? Não deves saber mas são as duas feitas na cama, uma não te posso dizer, a outra posso: É dormir!


Foi direita à casa de banho, demorou meia hora mas valeu a pena. Saiu outra, cabelo composto, olhos arranjados e cara pintada. Aspecto de gente.

Sentou-se, à mesa, e começou a barrar uma torrada. Mesmo de boca cheia tentou a sorte:

-Sabes, mano, que eu ando a precisar de uns dinheirinhos e tu podias, também, receber algum. Que dizes?

-Nem tenho assim nada de especial, mas dinheiro faz sempre jeito! Respondeu o irmão.

-Então conta, à mana, o segredo que sabes do pai ou da mãe e eu, sacana como sou, faço uma pequenina chantagem e saco algum que pudemos dividir. Que dizes?

-Sabes, Mónica, que por acaso, sei um segredo e grande. Mas tenho a certeza que não consegues com ele sacar dinheiro a ninguém.

-Parece que não me conheces, mas podes ter a certeza que consigo. Conta lá!

-Queres que conte, então aqui vai:
O Daniel, o teu namorado, diz que já tratou com uma parteira de tudo, podes ir quando quiseres tratar do teu problema.

-Tenho razão ou não?





20 comentários:

CÉU disse...

Linguagem bem popular, com todas as letras, ou quase, pois claro, pke é um texto escrito no masculino, portanto, entendo, perfeitamente o tipo de oralidade, aqui usada. Aliás, vocês, homens, têm um vocabulário muito próprio, e qdo as mulheres vos querem imitar, estupida e desinteligentemente, tentando aproximar-se das "igualdades", o k não tem nexo nenhum, pois homem e mulher são completamente diferentes, mas complementam-se, descambam, vulgarizam-se e só servem para.... chacota ou para mais alguma coisa.

Vamos ao seu texto, Então, que manos estes! Ela é "fresca"! Com k então, na cama, só se podem fazer duas coisas! Tem "futuro" a "piquena". Gosto mto de gente "séria", assim!! Qto ao Raimundo, ficámos sem saber o motivo daquele silêncio e tristeza, ou será k não entendi o k escreveu! Hum, duvido, mas....
Bem, então, a maninha está grávida. Sim, senhor! Continua, assim, k vais bem, minha "linda"!
Eu sei k os seus textos são fictícios, mas há situações iguais na vida, no cotidiano, desgraçadamente.

Agradeço visita e comentário, tal como votos de boa semana, que retribuo.

Bem, se o botão cair, esta menina porá a mão, no sítio devido, não tenha a mínima dúvida.

Boa semana. Abraço e fique bem!

CÉU disse...

O texto vai ter continuação ou não, Manuel? Narrativa aberta? Eu já imaginei tanto "cenário" para o segredo do Raimundo!

Abraço.

São disse...

Acho que os direitos da Mulher são os mesmo dos do Homem.

Não trocaria nunca o machismo pelo feminismo, pois ambos são maus.

Mas, sim, sou feminista...como não?

O texto? Bom como sempre,

Bom serão

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

"Atirou no que viu e atingiu o que não viu" : que dupla de irmãos, hein? Mas, independente do mal caráter de cada personagem, a construção do "enredo", como sempre, primorosa ! Como uma leitora que levantou a hipótese de uma "continuação", indago: vai ter, continuação? Há muita margem, para tal! Comece logo a escrever...se é que já não o fez!!!
Beijo, Manuel, até breve!

Unknown disse...

Manelamigo

O artigo é, como sempre, magnífico: aliás tu não sabes escrever de outra maneira.

O silêncio do Raimundo leva-me pelo contrário a contar um episódio de Goa:

Há uns largos anos (1980) entrei com dois primos da Raquel numa taverna. Estavam quatro senhores a jogar às cartas na mesa do fundo. De repente um levantou-se e disse-me assim "Por favor, fale" Eu, embaraçado "Falo; mas porquê?" "Queremos ouvir falar em bom Português; por favor fale"

Lá falei já nem sei o tema; mas falei, tanto quanto possível em "bom Português", melhor dizendo o Português possível. No fim, as faces dos quatro jogadores encheram-se de lágrimas. O silêncio é e oiro, mas as palavras são de platina ou de diamantes.

Perdoa-me o textículo, mas achei que o podia escrever - no Português possível.

Abç do Pernoca Marota

Janita disse...

O que eu lhe digo é que quem tem telhados de vidro não deve andar à pedrada!

E mais não digo pois não é preciso, Manuel!

Que dupla de manos, hein??

Abraço!

Janita

Gracita disse...

Um bela dupla heim?
O irmão tanto procurou que acabou descobrindo o segredo e de forma vil já que espreitou um objeto com mensagem que não lhe pertencia. Péssimo caráter do rapaz e a mocinha mercenária foi vencida e traída em sua ganância. Esse conto cabe ainda muitos mistérios e contendas amigo Manuel. Uma escrita primorosa.
Um grande abraço

chica disse...

Que beleza,Manuel e tenho certeza, estás cm um próximo capítulo na cabeça! vamos esperar! abração,chica

SOL da Esteva disse...

Muito bem, Manuel. Mais um belíssimo Conto curto para a Conta grande.
A quem segredos não tinha (Raimundo), a não ser vontade de "gozar" o momento, o "real segredo" chegou quando menos esperava; quem desejava lucrar ( Mónica) com a "desgraça alheia" para fazer render uns cobres, saiu-lhe um Tostão furado.
Parabéns, Amigo.



Abraços


SOL

Smareis disse...

Olá Manuel!

Excelente conto!

Péssimo modo desse camarada, e a irmã cheia de ganância, sempre querendo levar alguns “trocados” fosse o que for. Duplinha de mau caráter.

Seus contos sempre são próximos da realidade. Gostei bastante!
Deixo um abraço!
Uma boa semana!

Unknown disse...

Afinal o rapaz até sabia...e sabia demais...

ania disse...

Mais um belo texto muito bem construído, parabéns Manuel...gosto da tua inspiração! abraço, ania..

Magia da Inês disse...


Nossa!!! Surpreendente como sempre, no último minuto!!!

Desculpe-me pelo sumiço... estou suspirando por férias!!!
Muita paz e muitas alegrias!
Beijinhos.
❤ه° ·.

Unknown disse...


Olá Manuel,
Essa irmã deve ter ficado de todas as cores... afinal quem escondia um grande e valioso segredo era ela.

Beijinhos

CÉU disse...

Boa tarde e bom domingo, k já vai a meio, meu querido e prezado amigo, Manuel!
Não há ainda novidades, nem aqui, nem no meu espaço. Aguardaremos! No meu, posso adiantar k, após o jantar, haverá "fumo branco", se Deus quiser. Estou, ainda, nos retoques, e hoje, tb há o final da taça, portanto, é preciso ponderar todas essas fatores (sem "c", Manuel, pke não o lemos, portanto, para quê escrevê-lo?).

Todos nós k andamos sempre a dizer mal das burocracias, do tem de ir ali, depois mais além, depois àquele guichet mais ali à frente etc., então comecemos nós por desburocratizar alguma coisa, simplificar algo, e podemos fazê-lo na escrita, por exemplo. Todavia, se o Manuel escrever pharmácia, assim, como se escrevia no século XIX, não é erro ortográfico, aceita-se, só que é um arcaísmo.

E não venham falar em governo, em "Patriotismo" pke isso é um disparate crasso, é ignorância com tacanhez. A Língua, o Idioma, seja ele, qual for, dá e recebe influências. O "bué" já entrou no dicionário da Língua Portuguesa. Daqui por uns 50/60 anos vai ser uma palavra normal, como qualquer outra e vai ser aceite, naturalmente.

Bem, e por hoje, a "aula" terminou.

Um sereno e agradável domingo, e para não dizer que sou mísera, mando, também, um beijinho.

Smareis disse...

Olá Manuel!
Apena uma passadinha pra ver se tinha novidades.
Tem uma atualização no blog, caso queira conferir.
Uma ótima semana!
Um ótimo mês
Um abraço, e um sorriso!
Blog da Smareis

Mirtes Stolze. disse...

Boa tarde meu querido amigo Manuel.
Estava com saudades de ler os seus contos. A mentira que se tornou verdade, ele dizia tanto que tinha um segredo, que de fato aconteceu, para a infelicidade da irmã que tanto queria saber para tirar vantagem, onde ela esquecer que ela propria tinha um segredo que não queria que fosse descoberto. Meu amigo sinto muito não ter vindo antes te da noticias minhas, mas quando o problema envolve a minha filha, não perco em mais nada, só ontem entrei no virtual. Um lindo més de junho. Um forte abraço. Obrigada pela sua amizade.

dilita disse...

Olá Manuel
Voltei até aqui e voltei a ler... Quem por aqui passa "não sai de mãos a abanar"
Mas como já li este e os anteriores contos algumas vezes, agora venho à procura
de mais outro.(novo)
E amanhã, cá estarei.
Abraço.
Dilita

dilita disse...

Olá Manuel
Voltei até aqui e voltei a ler... Quem por aqui passa "não sai de mãos a abanar"
Mas como já li este e os anteriores contos algumas vezes, agora venho à procura
de mais outro.(novo)
E amanhã, cá estarei.
Abraço.
Dilita

CÉU disse...

Olá, Manuel!

Continuamos com o "Segredo", mas, penso k brevemente, teremos nova temática.
Já deixei comentário no blogue da Dilita, mas ela "não me ligou nenhuma". Pronto! Tenho de respeitar, mas gostava tanto k ela deixasse lá umas palavrinhas.
Tenho uma grande apreciação e respeito pelas modistas, umas autênticas SENHORAS.

Um dia feliz.

Beijinho, com a estima k já conhece.