terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Quase perfeita – Conclusão





Esta estória é para ter acabado como a publiquei no dia 24 de Janeiro, mas pediram-me a continuação. Eu não me apetecia, porque adivinhava um final pouco romântico, mas a vida é mesmo assim!




De repente o rapaz alegre, desprendido e que encarava a vida como um jogo, que cada dia desfrutava da melhor maneira, olhava o Sol de manhã e já não via a magia.

Perdeu a alegria, ficou apático, refugiou-se nos estudos e mais nada lhe despertava o interesse.

Queria comer, mas os alimentos ficavam enrolados na garganta.
Perdeu o apetite!

Dona Ângela, a mãe, estada preocupado, o filho sempre foi um rapaz alegre, pronto para a brincadeira e, de repente, a tristeza tomou conta dele, como se algo de muito grave tivesse acontecido.

-Elias, que se passa contigo filho? Perguntou dona Ângela? Se calhar posso ajudar, fala comigo!

Os olhos de Elias ficaram cheios de lágrimas, tapou a cara com as mãos, enquanto ia arrepelando o cabelo.

Quase num lamento, com a voz distorcida pela insegurança, respondeu:

-Mãe estou apaixonado!

-Mas, Elias, isso é sinal de alegria e eu só vejo, em ti, tristeza!

Respondeu num soluço:

-Era mãe! Se eu soubesse por quem! Mas não sei quem é, como se chama e onde a posso encontrar!
Estou perdido e não consigo deixar de pensar em alguém, que vive dentro de mim, mas não a consigo descobrir cá fora!

Dona Ângela ficou em silêncio, não tinha palavras, era uma situação para a qual não estava preparada.

Tinha que reagir, o filho estava a atravessar uma fase difícil e ela tinha que fazer qualquer coisa.

Sentou-se ao seu lado e pediu:

-Vá, conta tudo à mãe!

Elias, olhou-a com os olhos embaciados, mas sentiu um enorme conforto em poder compartilhar, toda a mágoa que sentia dentro do peito.

-Sabes mãe? A primeira vez que a vi pareceu-me que, Tétis, tinha emergido das águas para me encantar. Olhei, aquela imagem, e senti que tudo tinha mudado, pensei que o destino estava a traçar o meu caminho.

Mas fui ingénuo e deixei-a fugir sem, sequer, lhe ter perguntado o nome. Mas não desisti, procurei e Deus deu-me, uma segunda oportunidade.

Lá estava ela, novamente radiosa, como se estivesse à minha espera.

Voltei a meter conversa! Não me tinha esquecido! Conheceu-me pelas mãos tão suaves e delicadas.
Foi aí, que percebi que era cega, fiquei tão perturbado que a deixe ir embora, outra vez, sem sequer, lhe perguntar o nome.

-Mas o facto de ser cega faz alguma diferença? Perguntou a mãe.

-Não mãe! Gritou Elias.

Dona Ângela abraçou o filho, limpou-lhe as lágrimas e prometeu:

-Eu vou ajudar-te, juro que vou!

***
Ângela do Carmo era uma mulher determinada, de convicções, viúva há 14 anos. Foi pai e foi mãe e estava orgulhosa, da forma como tinha criado e educado o filho.

Mantiveram, sempre, uma grande cumplicidade, partilhavam as mágoas e as alegrias. Nunca tiveram segredos, aliás, apenas um que ainda, agora, não tem coragem de contar.

Ela tem um amante!

Uma relação de oito anos. Não queria casar, nem uma vida em comum, queria, apenas, um companheiro numa relação aberta, sem compromissos, sem amarras e sem obrigações.

Era como dizia, para ela própria, uma necessidade para se sentir viva.

Hoje, o filho, precisava e ia estar presente.

Prometeu ajuda mas, confessava, não sabia por onde começar. Talvez o Licínio, o seu namorado a pudesse ajudar.
Tem tempo e é muito perspicaz!

****
Licínio adorou a ideia, desde que se reformou, apenas se sentia bem na companhia da Ângela, o resto do dia era passado num total enfado, numa pasmaceira.

Pensou escrever um livro mas as ideias, que eram muitas, não saiam fluídas quando as queria por no papel. Pensou, se calhar esta coisa, da escrita, não é para quem quer, deve ser preciso algo mais que vontade!

Mas, Ângela, escondia do mundo o namoro como se fosse algum sacrilégio ou pecado, quando todos, incluindo o Elias, sabiam dessa relação.

*****

A estratégia estava montada, se Elias a viu, por acaso, em dias sem qualquer ligação lógica, era preciso estar atento a todos os momentos.

Sempre que o Sol fizesse parte do dia, Licínio, montava uma espécie de sentinela móvel, perscrutando todos os que se sentassem nos bancos ao longo do cais, nos carros de estilo que por ali estacionassem e pelos motoristas fardados em espera atenta.

Foram doze longos dias, também o tempo não ajudou, mas naquele sábado, um descapotável, estacionou na marginal e um motorista, com guarda pó cinzento, pegou delicadamente nas mãos de uma linda mulher e conduziu-a, carinhosamente, para um lugar vago num banco.

Com a mesma destreza voltou ao carro, encostou-se e ficou atento.

Chegou a hora, pensou Licínio, vou começar pelo motorista.

Aproximou-se, quase de forma casual, olhou com ar de aprovação o automóvel, e de um modo a mostrar apreço perguntou:

-Este modelo é recente?

O homem era estranho, magro, macilento e tão pálido que parecia ter saído de uma longa doença.

Olhou o recém-chegado, sem estranheza, e de forma natural respondeu:

-Este carro será sempre recente, tenha a idade que tiver!

Não lhe pareceu muito lógica a resposta, mas não podia desarmar:

-Hoje está um belo dia para, trazer a menina……a apreciar esta bela paisagem!

-Joana! Exclamou o homem, a menina Joana!

Fingiu desinteressar-se, anotou a matricula deixou umas boas tardes e foi espreitar a rapariga.

Elias tinha razão, era uma bela e linda mulher. Vestida de forma simples mas com, estudada, elegância e requinte.

***

Telefonou à Ângela, quando ela atendeu, com a voz mais misteriosa que conseguiu disse-lhe:

- Sabes amor! Tenho notícias muito boas, mas só te conto tudo se aceitares, finalmente, casar comigo!
Logo falamos, em minha casa. Tá bem?

Desligou e dirigiu-se para o autocarro, ia falar com um ex-colega, precisava saber em que nome estava registado o automóvel.

Ângela chegou às oito horas, vinha ansiosa, transpirava curiosidade por todos os poros, mas aos olhos de Licínio estava, como sempre, linda.

Deu-lhe um beijo fugidio e pediu:

-Conta tudo, diz-me o que descobristes homem, antes que eu rebente de ansiedade!

Licínio sorriu, fez um ar importante, antes de responder:

-A diva chama-se Joana, mora em Cascais! Tenho aqui a morada e o Elias tem bom gosto, a rapariga é cá um borracho que nem te digo!

Ângela deu uma gargalhada antes de responder:

-Pois tem, é como a mãe! Podemos ir amanhã a Cascais falar com a rapariga?
Mas, por enquanto não conto nada ao rapaz!

-Contigo vou a todo o lado! Respondeu o namorado.

Foi fácil encontrar a Vivenda, era enorme, rodeada por um jardim mal tratado, onde as ervas cresciam juntas com as flores, a relva há muito não era aparada.

Tocaram ao portão, o som de um carrilhão fez-se soar ao longe.

Passaram alguns minutos e ninguém respondeu, Licínio voltou a insistir e o mesmo som distante, mas agora alguém abriu a porta e espreitou.

Uma voz velha, algo sumida e denotando muito cansaço perguntou:

-Quem é?                                                               

Ângela, respondeu:

-Minha senhora, vimos de Lisboa e gostaríamos de falar com a Joana!

A voz, ainda, pareceu mais velha e cansada:

-Entrem, mas já disse tudo o que sabia!

O portão rangeu, como se há muito não tivesse servido, mas lentamente abriu o suficiente para poderem entrar.

Percorreram o pequeno caminho, de saibro, onde as ervas despontavam por entre as pedras.

A mulher tinha um ar, mesmo muito cansado ou, talvez seriamente doente. Magra, extremamente magra, as olheiras fundas davam-lhe um aspecto tão triste que contagiava.

Olhou-os do fundo de uns olhos piscos e perguntou:

-São da polícia, não são?

Os dois, quase, em uníssono:

-Não, não temos nada a ver com a polícia, só queremos falar com a Joana!

A velha deixou cair umas lágrimas  das poucas que lhe pareciam restar. Deu um aí, tão fundo que doeu ouvir. Depois com aquela voz cansada e sumida falou:

-Vai fazer três meses, agora no dia 25, que a minha neta Joana e o Ambrósio, o nosso motorista, tiveram aquele terrível acidente.
Deus não quis que se salvassem, morreram os dois.
O Ambrósio ficou ali mesmo, a Joana ainda esteve dois dias em coma, mas não aguentou, partiu também. A minha neta era doida por estar ao pé do mar, ficava horas olhando as ondas, enquanto o Ambrósia esperava como um cachorro dedicado.

Parou, um pouco, para ganhar força e continuou:

-Naquele dia, um doido chocou contra eles, foi uma coisa horrível! Não consigo esquecer!

Ângela estava petrificada Licínio, mais racional, perguntou:

-A sua neta era invisual?

-Não! Respondeu a velha, mas se tem resistido, segundo o médico, ia mesmo ficar cega, os olhos ficaram muito mal tratados. Pobrezinha!

-E o carro? Perguntou, Licínio.

-O carro? Bom o carro não tem conserto, foi por isso que pensei que fosse a polícia, por causa do seguro.

Desculpem mas estou muito cansada, agora têm que ir embora!
Não me achem indelicada!



18 comentários:

Flor de Lótus disse...

Olá,Manuel!Saudades de ti e de vir aqui.
Realmente nem sempre é possível que as histórias tenham os finais que a gente gostaria que elas tivessem,mas a vida real é assim cheia de caminhos e descaminhos.
Beijocasss

chica disse...

Puxa,Manoel, deste uma continuação maravilhosa. Trama envolvente e o final, como a imaginação de um escritor...Lindo! Gostei! abração,chica

Unknown disse...

Pois parece que isto ainda não está tudo contado e que o suspense se mantém.
Desembucha tudo homem...
Quero ler o resto desta história...

http://odeclinardosonhos.blogspot.com disse...

A isto chama-se fazer-nos sofrer!!!!!
Só apetece perguntar: e depois? e depois?
Mas não há remédio temos que esperar...ou não?
beijo amigo

SOL da Esteva disse...

Este final, Manuel, presta-se a uma terceira parte.
Certamente irás "construir" algo mais que faça tremer o Elias. Afinal, ele não ficou no retrato final, não é?
Fabulosa a tua imaginação.
Parabéns.


Abraços



SOL


Janita disse...

O "Quase Perfeita" ficará perfeita com a explicação deste mistério?

Nem sempre há explicação para tudo e essa paixão do Elias é igual a tantas de quem ama sem saber porquê, nem a quem.

Mas como não quero ser desmancha prazeres, se a Joana estiver viva e não for uma aparição, ficarei muito feliz com a felicidade de todos e o casemto da Angela e do namorado.

Intrigada, fiquei eu, quando fui ler a 1ª parte, vi que já a conhecia, inclusivamente o comentário do JP, referente à tequila e sem dar importância ao nome da moça...e não vi nenhum comentário meu! Será que se perdeu, ou terá a ver com o mistério da história?

Um abraço e bom Carnaval, Manuel.

Anónimo disse...

Olá, estimado Manuel!

Obrigado pelo seu carinhoso comentário.

Pois, coitado do rapaz! Tão apaixonado! Mas, a Joana não era cega? Não entendi a resposta da avó, atendendo ao seu texto anterior.
Fazia-se cega, surda e muda, não?

Triste fim, mas tinha de dar um final à sua história e este era um dos possíveis e até talvez o mais esperado.

Resto de bom dia.
Beijo da Luz, com estima.

Laços e Rendas de Nós disse...



Manuel, o carro e os ocupantes estão em parte incerta. Eles vão regressar e o Manuel vai contar como tudo foi possível.

Beijo

Laura

chica disse...

Volto pra agradecer e contar um desabafo.A partir de agora espalharei ao mundo todo o horror que é Porto Alegre, cidade onde moro, sem segurança a oferecer aos moradores. Hoje à tarde, em uma praça, com as crianças, fomos assaltadas com arma, por um meliante que circula soltinho da silva. Nós, cada vez mais presos e inseguros nessa porcaria de cidade.

Quem vai mais uma vez devolver a confiança de circular? A paz? A liberdade às crianças? Um horror e pior é que a propaganda que fazem para os de fora é que é uma cidade maravilhosa. Estou ainda chocada, agradecendo apenas ao Alto por poder gritar e reclamar e o farei SEMPRE. Não podemos mais nos calar! Pagamos impostos e nem educação, nem segurança, nem saúde funcionam! abração,chica

Fica o aviso pra quem interessar possa: Porto Alegre é um Porto Inseguro, Triste e Mal Cuidado!

Magia da Inês disse...

É, amigo!
A história acabou mal mesmo!!!
Que imaginação, hem?!
Boa quarta-feira!
Beijinhos.
♫♫•*¨*•♫♫

Palavras disse...

Olá meu caro,

nem toda históriatem um final feliz. Faz parte!

Grande abraço

Leila

Vivian disse...

Bom dia,Manuel!!

Nossa, meu amigo!! Uma história que li de um fôlego só!E com um final surpreendente, com um toque sobrenatural que me deixou arrepiada!
Uma bela continuação.(mesmo não sendo um final feliz.)
Beijos e meu carinho!

JP disse...

Olá Manuel,
Julguei que as ferias se prolongavam, pois não me aparecia nada do "Navoltadotempo"

Quanto a esta conclusão(?)...pois, nem sempre há finais felizes não é?

A sua imaginação é uma coisa tremenda.

Abraço

Magia da Inês disse...

♪♫º♫♫º
Olá, amiga!

Passei apenas para saudá-lo.
ღ°Bom fim de semana! ♪♫º
♪♫♫º Beijinhos.
♪♫º Brasil.♪♫♫º
♫♪•.

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Grande final, dentro da doutrina espírita.
Concordo, com alguns que pedem a continuação da estória: a reação de Elias!
A sua imaginação é de grande fertilidade. Parabéns!

Um beijo,bom domingo!

Anónimo disse...

Mas, com um dia cheio de luz, ameno, com temperaturas médias, por onde anda, este "senhor"?

Olá, querido amigo Manuel!

Chove a potes, em Lisboa. Estou fartíssima deste tempo.

Deixei-lhe um recado, uma resposta no "Luzes" ao seu comentário. Passe por lá.

Não me diga, que, hoje, está a trabalhar (trabalhando, como se diz não nossso ALENTEJO)?

Não publiquei poema, este fim de semana, por não ter escrito nada, atempadamente. Fica para a próxima.

Bom domingo.
Beijos, com estima.

Projeto de Deus 👏 disse...

Manuel!

Peço desculpa por está um pouco ausente,eu na verdade sinto muita falta de todos os amigos/as.

Estou só dando um tempinho,logo logo espero voltar com bom animo.

Quero que saiba que gosto muito de ler seus contos, gosto de te visitar, mesmo quando não comento.

Um beijo carinhoso meu querido.

Sónia da Veiga disse...

Irra, que tu e os finais felizes... nem a saca-rolhas!!!
A ver se a conclusão definitiva é mais animadora! Pelo desenho, parece! ;-)